Sumário
- 1.
Introdução: distinção conceptual, objetivos e metodologia.
- 2.
Análise do corpus.
- 2.1.
Metafonia exercida por -u final.
- 2.2.
Inflexão vocálica.
- 2.2.1.
Exercida por semivogal [j] de ditongo decrescente secundário.
- 2.2.2.
Exercida por semivogal [j] sobre a vogal tónica de uma sequência vocálica.
- 2.2.3.
Exercida por vogal anterior da sílaba postónica em palavras proparoxítonas.
- 2.2.4.
Exercida por grupo consonântico heterossilábico /ŋg/.
- 2.2.5.
Exercida por consoante nasal homossilábica.
- 2.2.6.
Exercida por consoante nasal heterossilábica: o caso de teſtemõio / teſtemonho > teſtemuȷ̃o / teſtemunho.
- 2.2.1.
- 2.1.
- 3.
Resultados e discussão.
Contents
- 1.
Introduction: conceptual distinctions, aims and methodology.
- 2.
Analysis of the corpus.
- 2.1.
Metaphony triggered by final -u.
- 2.2.
Vowel inflection.
- 2.2.1.
Triggered by semivowel [j] of falling secondary diphthong.
- 2.2.2.
Triggered by semivowel [j] on the tonic vowel of a vocalic sequence.
- 2.2.3.
Triggered by front high vowel of post-tonic syllable in proparoxytone words.
- 2.2.4.
Triggered by heterosyllabic consonant group /ŋg/.
- 2.2.5.
Triggered by homosyllabic nasal consonant.
- 2.2.6.
Triggered by heterosyllabic consonant: the case of teſtemõio / teſtemonho > teſtemuȷ̃o / teſtemunho.
- 2.2.1.
- 2.1.
- 3.
Results and discussion.
1. INTRODUÇÃO: DISTINÇÃO CONCEPTUAL, OBJETIVOS E METODOLOGIA
Do ponto de vista conceptual, e baseando-nos na metafonia especificamente (galego)‑portuguesa, distinguir-se-á, neste artigo, metafonia de inflexão vocálica (; ): encara-se a metafonia como um fenómeno histórico que consiste na alteração do timbre da vogal da sílaba tónica por influência da vogal final (a, no caso de abertura; -u e -i, no caso de fechamento). Tendo em conta que nos textos em prosa apenas é possível estudar os casos em que existem manifestações gráficas do fechamento da vogal, centrar-me-ei na metafonia pronominal exercida por -u (especificamente portuguesa, no quadro das línguas românicas) e na metafonia verbal por -i final. Reservarei a designação de “inflexão vocálica” para os fenómenos de fechamento da vogal tónica, podendo este ser exercido por um qualquer elemento fónico em contiguidade imediata ou não com aquela vogal.
Segundo , e no que concerne a metafonia, “a orixe dessa mutación no timbre da vocal tónica debe buscarse no domínio da fonética e non no da morfoloxía”. Por outro lado, para “la metafonia es un fenómeno que ofrece múltiples aspectos de interés y el fonético ha quedado descuidado en los estudios diacrónicos”. Sabemos, de facto, que o critério fonético só por si não basta: “uma palavra no estado actual da sua evolução pode realmente explicar-se por uma certa etimologia, e todavia pode ter atravessado fases, que são inexplicáveis por ela” (). Assim, o objetivo deste estudo é fornecer mais pistas para tentar compreender:
- (i)
por que motivo a metafonia e a inflexão vocálica não atingiram de igual modo os mesmos itens lexicais do português, do galego, do asturiano e do castelhano, ao longo do seu devir temporal;
- (ii)
a avaliação social da mudança no espaço galego-português, tendo em conta o elemento fónico que exerceu essa alteração;
- (iii)
a relação entre o oral e o escrito nesse processo de difusão.
Como se sabe, são escassos os testemunhos documentais que possam lançar um pouco de luz sobre os fenómenos mencionados, ao longo da sua trajetória histórica, nos diferentes espaços ibero-românicos. Neste artigo, disponibilizam-se alguns dados cronológicos de textos portugueses medievais (organizados num corpus) que podem contribuir para esclarecer a complexidade das motivações e da direccionalidade da mudança, bem como o seu contexto fonológico, lexical e discursivo ao longo dos tempos.
2. ANÁLISE DO CORPUS
O corpus que serviu de base a esta pesquisa é constituído por 153 documentos notariais autênticos, situados entre os séculos xiii e xvi, oriundos dos fundos do Mosteiro de Santa Maria de Alcobaça (IAN-TT, Lisboa, 1.ª e 2.ª incorporações), por mim própria transcritos, de acordo com o respeito escrupuloso pelo manuscrito: são oito os documentos localizados no século xiii, cinquenta e oito no século xiv, setenta no século xv e dezassete no século xvi (Carvalho 2017).
2.1. Metafonia exercida por -u final
Como já referimos, encaramos a metafonia exercida por /u/ (<o>) final como um fenómeno que consiste no fechamento do timbre da vogal da sílaba tónica por influência dessa vogal que, no caso do português, é fechada. Trata-se, por isso, de um fenómeno que individualiza o português no seio dos restantes idiomas ibero-românicos. De acordo com , “de todos os aspectos do vocalismo histórico português, o mais interessante e que imprime um carácter inconfundível a esta língua é o da metafonia”. Já a exercida por /i/ final é partilhada com outras línguas hispânicas, nomeadamente o espanhol e o galego.
2.1.1. Metafonia exercida por /u/ final sobre a vogal tónica /e / (< Ĭ)
O fechamento do timbre da vogal /e/ (< Ĭ) da sílaba tónica já se encontra documentado nos textos da primitiva área galego-portuguesa, nos finais do século xiii e primeiros anos do século xiv , em todas as províncias, devendo-se à influência assimilatória de u final (). Também na nossa coleção, já desde o século xiii, mas sobretudo a partir do segundo quartel do século xv, registam-se nos documentos formas que em vez de e apresentam y e j em sílaba tónica. Referimo-nos a formas historicamente representantes dos pronomes demonstrativos neutros latinos (< ĭstŭ- e < ĭpsŭ-). No Gráfico 1 apresentam-se, em valores absolutos e em percentagens relativas, as formas encontradas em toda a coleção documental.
Da análise do gráfico depreende-se que não foi igual a incidência da metafonia em toda a série pronominal em apreço, sendo aparentemente residual a ocorrência registada do demonstrativo deítico yſto. Uma análise detalhada dos contextos em que figuram as formas desta série pronominal poderá, no entanto, projetar luz sobre a relativa escassez de testemunhos. Vejamos, na Tabela 1, os contextos das formas inovadoras nos documentos em que ocorrem.
O que nos parece importante realçar é que a forma ducentista yſto surge numa carta partida por a b c, apesar de não se notarem nela as características externas de validação anunciadas, como as letras do alfabeto (com os recortes dentados). Poderá, eventualmente, tratar-se de uma minuta (de um documento original, portanto), que terá ficado no arquivo do mosteiro e, eventualmente por isso, dispensaria o selo ou outras técnicas mecânicas de validação. A margem direita é extremamente exígua, deixando adivinhar um corte feito muito junto do fim das linhas. Este aspeto poderá justificar a ausência de vestígios de quirografia, que não coloca em causa a autenticidade do documento. Do que parece não haver dúvida é de um certo grau de descuido colocado na redação, que deixa entrever de modo singular alguns traços da língua oral.
Segundo :
sendo sen dúbida moi antiga a metafonia exercida en galego e mais en portugués por /-u/ ou /-ʊ/ átono final, as solucións mais estendidas nos estadios iniciais do período literario de ambos os romances son aquelas que non presentan elevación da vogal tónica. Por tanto, (aqu)isto, isso e aquilo semellan innovacións relativamente tardías que talvez obedecesen non a un impulso fonético, senón a un impulso puramente morfolóxico.
Sem questionar a legitimidade das considerações de Mariño Paz, e tendo em conta as observações já feitas sobre o documento 1291 Alc 2, parece-nos importante distinguir duas entidades diferentes: a língua em que eram escritos os documentos e a língua que se falava na época, sendo certo que nem todos os tabeliães mantinham o mesmo tipo de distanciamento perante o código a que obrigava a redação dos documentos. Pensamos, portanto, que a forma yſto, que surge no documento de 1291 já corresponderia a uma forma linguística viva na zona Centro do país, mas a grafia tenderia a ocultar durante quase dois séculos o que era a realidade linguística. Quanto à forma jſſo, que surge apenas em meados do século xv, também parece interessante salientar que se difundiu em contexto de retoma discursiva no conector deítico, de carácter anafórico, jſſo medes .
Como se sabe, a metafonia neste tipo de formas pronominais invariáveis, embora de lenta difusão ao longo da história da língua, foi aceite na norma culta portuguesa, tendo consequências na morfossintaxe, que são – como refere – as de proporcionar “unha mais nítida caracterización e diferenciación da serie invariable do paradigma dos demonstrativos”.
Ao apresentar quatro paradigmas para as variantes fonéticas dos demonstrativos no galego, sublinha que “o paradigma C, com hipercaracterización mórfica nas formas neutras (vocal radical i e terminación -o) rexístrase en dúas zonas sen continuidade xeográfica: o extremo nordeste da Coruña e o centro e sur de Pontevedra”. Por outro lado, refere que “o paradigma D presenta hipercaracterización mórfica nos tres xéneros, o mesmo cá lingua portuguesa (…). Este paradigma rexístrase nalgúns puntos do Baixo Miño (…) e nalgún do Condado, todos eles na raia con Portugal”.
No espanhol, como é sabido, não existem as formas metafónicas.
2.1.2. Metafonia exercida por /u/ final sobre a vogal tónica /o/ (< Ō)
Um outro tipo de vogal que evidencia fechamento do timbre na sílaba tónica é a vogal posterior médio-fechada /o/ (< Ō). Apenas nos é possível inferir a existência desse tipo de metafonia, já desde os finais do século xiv, em formas como tudo, historicamente proveniente de tōtu- latino, uma vez que a metafonia por /u/ final se traduziu em mudança de grafema. São raríssimas as abonações encontradas, como se verifica no Gráfico 2.
É interessante, novamente, salientar que a primeira ocorrência de tudo pode verificar-se num documento do século xiv (1375), mas já no final do texto, o que poderá revelar a consciência diafásica do tabelião. Vejamos os contextos de ocorrência, na Tabela 2.
A forma tudo difundiu-se ao longo do século xv, tendo vindo a implantar-se na norma culta portuguesa, criando um valor novo na morfossintaxe pronominal do português, que é o surgimento de uma forma invariável aplicável à totalidade de objetos inanimados (O João comeu o bolo todo / O João ficou todo contente / Todo o homem é mortal ≠ O João comeu o bolo, as bolachas, o iogurte, o pão O João comeu tudo). No asturiano, para além da variante todu (em Llanes) e do paradigma todu / toda (Teberga, Somiedu, Palacios del Sil, Allande, por exemplo), encontra-se na variedade da zona de Astúrias Central o paradigma todu / toa / too em variação com tudu / toa / too (expressão metafonética). Podemos, portanto, interrogar-nos sobre o motivo por que no galego e no espanhol as formas com metafonia não se estabeleceram, uma vez que o fenómeno era conhecido em vários focos da Península.
2.1.3. Metafonia exercida por /i/ final sobre /o/ (< Ŭ)
Iremos analisar um tipo de metafonia que o português partilha com outras línguas românicas, aquela que consiste no fechamento do timbre da vogal da sílaba tónica por influência de i final (< Ī). Selecionámos, para tal, a forma historicamente resultante de fŭī, primeira pessoa do Pretérito perfeito do verbo SER, e apresentamos, na Tabela 3, as ocorrências que revelam a ação metafónica de i final, registadas no corpus.
Saliente-se que (f)fuy aparece já no último ano do século xiii, mais cedo, aliás, do que foy (que se revela no documento 1315 Alj 15), o que parece diagnosticar uma tendência antiga para o fechamento desta vogal.
O estado de indiferenciação quanto ao emprego de fui e foi para a primeira pessoa do singular do pretérito perfeito pode observar-se até 1453 (para a terceira apenas se regista oscilação uma vez, em fuy, no doc. 1289 MA 1 e primeiro da coleção). A partir daí os contextos deste tipo são escassos, mas pode constatar-se que em finais do século xv, ffoy era uma forma de primeira pessoa de Pretérito perfeito do verbo ir, usada por um tabelião de Aljubarrota: “me ffoy com elle a vylla de Porto de Moos” (1491 Alj 133), alternando, no mesmo documento, com “eu ffuy rrequerydo”, 1.ª pessoa do pretérito perfeito do verbo Esse. Esta coexistência revela, de resto, que o supletivismo verbal não estava ainda completamente enraizado na consciência coletiva. No século xvi, as ocorrências deste corpus (embora raras, devido ao seu escopo cronológico) apresentam o vocalismo do português atual.
Os dados quanto à cronologia do fenómeno revelam-se interessantes e conduzem a constatar que, também na zona Centro-meridional portuguesa, os documentos evidenciam o estado de flutuação que se verificou na zona galego-portuguesa primitiva. Segundo , “registaram-se apenas três exemplos da forma foy correspondentes à primeira pessoa em documentos da província do Minho, do século xiii ou dos primeiros anos do século xiv”, o que leva a autora a afirmar, relativamente à Galiza, que “ao contrário do que acontecia a sul do Minho, até bastante tarde continuou a consciência coletiva a tolerar essa confusão” (). De acordo com :
A especialización de fui (e fun) para a P1 e foi para a P3 só viria despois da inicial etapa de indiferenciación e obedecería a razóns de regularización que cobrarían vigor sobre todo a partir do momento en que a lingua foi comezando a ser un instrumento de comunicación supralocal.
É interessante registar que, segundo , em alguns dialetos nortenhos e mesmo no Centro de Portugal conserva-se ainda a flutuação entre foi e fui, para a primeira pessoa.
Por último, ainda no segundo quartel do século xiv registámos apenas uma vez a variante mais antiga da forma historicamente representante de ŭbī: ho (1336 Alj 26), num documento de Aljubarrota, o que revela que a metafonia neste tipo de formas não se teria dado simultaneamente em todos os níveis sociogeográficos. A forma hu é, no entanto, cronologicamente anterior, ocorrendo 30 vezes ao longo do corpus face a três ocorrências da variante gráfica u, sendo que a última foi evidenciada em meados do século xv, num texto oriundo da zona mais periférica do couto (Alvorninha). Apresentamos as ocorrências na Tabela 4.
2.2. Inflexão vocálica
2.2.1. Exercida por semivogal [j] de ditongo decrescente secundário
Só excecionalmente se encontra moyto (forma evolucionada de mŭltu), num documento escrito na Aldeia do Mosteiro (1350 AM 36) redigido por “Ffernã Domȷ̃giz, tabeliõ d’El Rey”, o que corresponde a 2%. Todas as restantes formas desta coleção (desde 1289) apresentam o resultado da inflexão da vogal da sílaba tónica, exercida pela semivogal resultante da vocalização do primeiro elemento da sequência -lt-. Analisemos, na Tabela 5, as ocorrências registadas.
A Tabela 5 mostra-nos uma única ocorrência da forma moito, sem inflexão vocálica, datada de um documento de 1350, escrito na Aldeia do Mosteiro. Hoje, como se sabe, a forma standard galega é moito, embora a forma muito (semelhante à portuguesa) tenha grande presença em algumas variedades diatópicas. De acordo com , “poden distinguirse seis sistemas principais”, sendo que “o sistema A (só ditongo oi) é o da maioría dos falares galegos”. No asturiano e no castelhano, a forma atual é resultante da inflexão: munchu/muitu e mucho, respetivamente.
2.2.2. Exercida por semivogal [j] sobre a vogal tónica de uma sequência vocálica
Há uma situação em que se regista o fechamento da vogal nasal, inicialmente em contacto com a anterior média pretónica (/aN/ teve, assim, a realização [ẽ]). Referimo-nos à evolução: de + ĭ(n)ante > deante (arc.) > diante, cuja vogal tónica, a partir de meados do século xv, sofre um processo de assimilação progressiva motivada pela vogal anterior (tornada fechada), dando origem a formas idênticas às que ainda hoje permanecem vivas na linguagem popular (*diente, pop.). Analisemos a evolução e a frequência de ocorrências na Tabela 6.
Analisando a tabela 6, podemos verificar que as formas do tipo *diente ocupam 50% num documento de 1453, mas ocorrem já de modo exclusivo num documento do século xvi (1519: diẽte e dyẽte). Podemos interrogar-nos sobre os motivos por que esta alteração de timbre, que ocorreu tardiamente, não veio a estabelecer-se na norma culta portuguesa.
2.2.3. Exercida por vogal anterior da sílaba postónica em palavras proparoxítonas
Como veremos a seguir, no representante histórico de legĭtĭmu-/-os, a inflexão vocálica verifica-se já desde o 2.º quartel do século xiv e no de dēbĭta-/-s, a partir do século xv. Em ambos os casos, não se encontram, ao longo do corpus, as variantes com /e/ na sílaba tónica. Apresentam-se a seguir os exemplos recolhidos:
Representante histórico de legĭtĭmu-/-os:
Representante histórico de dēbĭta-/-s:
-
diujdas (1379 Alc 51; 1402 MA 67), dyujdas (1383 Alj 53), díuida (1412 Ped 74), díuyda (1412 Ped 74), diuyda (1412 Ped 74, 4 v.), dȷ́ujda (1430 Cós 89), djujda (1444 Alv 100, 2 v.), djujdas (1444 Alv 100) e diujda (1451 MA 105).
Tais dados estão, aliás, em consonância com a tendência registada nos documentos portugueses da área galego-portuguesa, editados por :
É interessante observar a coexistência das formas com e sem inflexão, não só no período mais antigo, mas ainda durante os séculos xiv e xv. Os documentos da região de Entre-Douro-e-Minho oferecem apenas as formas mais modernas com i na sílaba tónica.
Já nas fontes galegas medievais falta a “fixación dunha solución estable para as bases dēbĭtu e dēbĭta (…). A preferência polas formas com /ˈe/ talvez haxa que atribuíla á atracción exercida polo verbo deuer” (). Como sabemos, a forma galega atual é débeda e a espanhola é deuda, em ambos os casos não se tendo verificado o fechamento da vogal tónica.
Um outro caso em que se verifica a elevação da vogal tónica devido a inflexão vocálica por ação de /i/ da sílaba postónica diz respeito à forma historicamente representante de dŭbĭta. Analisemos as formas encontradas, tal como apresentadas na Tabela 7.
Os exemplos de que dispomos apresentam o resultado da inflexão, já desde os primeiros anos do século xiv: duuida (1304 Alc 9) é relativamente coeva de douida (1289 MA 1; 1305 Alp 11; 1306 Cós 12). Sabemos, também, que todos os exemplos registados nos textos a partir de 1375 apresentam a vogal u. Atualmente, quer o galego quer o asturiano e o castelhano apresentam igualmente o resultado do fechamento da vogal.
Consideremos agora as formas proparoxítonas com /e/ na sílaba tónica e /i/ na postónica, historicamente resultantes de dĕcĭma-, dĕcĭmu- e dĕcĭmas, respectivamente: dezima, dezimo, 2 v., e dezimas, todas elas presentes no mesmo documento (1338 Alv 28). É fácil admitir que, nesta fase da evolução da língua portuguesa (2.º quartel do século xiv), o timbre da vogal da sílaba tónica fosse ainda aberto, ou seja, que ainda não se tivesse operado a inflexão exercida por i postónico. No entanto, a forma dezema, que surge num documento de 1425 paralelamente a dizymas e dizymos (1425 MA 84) parece provar que a inflexão de i postónico já se teria exercido, pelo menos para uma fase intermédia, com [ẹ] na sílaba tónica, pois não parece provável que o mesmo tabelião usasse no mesmo documento uma forma com timbre aberto e outras duas com fechamento em dois graus. Por outro lado, a presença de e (e não i, conforme o étimo) na sílaba postónica só pode explicar-se por assimilação (verificada posteriormente) exercida pela vogal da sílaba tónica. Vejamos os exemplos referidos, na Tabela 8.
Mais uma vez, o 1.º quartel do século xv é um marco de periodização importante, à semelhança do que acontece com inúmeros outros fenómenos considerados balizadores do período arcaico, pelo que este tipo de inflexão poderá acrescentar-se aos fenómenos de natureza fonético‑fonológica cujo trajeto temporal já traçámos anteriormente (). Formas que apresentam inflexão encontram-se abundantemente representadas em textos do galego medieval, tal como confirmado por . Ao referir-se aos documentos editados e estudados por Maia, o autor sublinha:
as maioritarias formas con /ˈi/ comparecen nos textos provenientes da zona centro-meridional galega correspondente ás actuais provincias de Pontevedra e Ourense e á metade meridional de Lugo, así como tamén nos producidos na colindante zona noroccidental portuguesa, en que están completamente ausentes as solucións escritas com <e> Para ela, os notarios portugueses, compelidos a utilizar unha variedade lingüística oficial relativamente constituída xa no período tardomedieval, optarían decididamente polas formas xa canónicas ou semicanónicas con /ˈi/, mentres que os galegos, carentes dunha variedade prestixiosa análoga que as circunstancias históricas da época facían inviable, daríanlles maior cabida ás solucións com /ˈε/ ou con /ˈe/ (grafadas com <e>) e, en definitiva, configurarían unha situación en que habería máis lugar para a variación na lingua escrita ()
A foma inflexionada não se manteve na língua standard galega, que apresenta hoje a forma décimo, e a forma do espanhol evidencia o resultado da ditongação: diezmo.
A partir do terceiro quartel do século xiv, formas como adobio(s), adobjos, adobyos, adobíȷ́oσ (< adŭbĭŭ) (‘reparações de casas, adornos’) alternam com adubio(s), adubjos, adubyo(s) e adubíȷ́o, o que atesta a inflexão vocálica exercida pela semivogal da sílaba postónica: a partir de 1375 contam-se 15 formas com u tónico e 12 formas com o, registando‑se, por vezes, essa flutuação no mesmo documento: adobjos/adubjos (1429 MA 88) e adobyos/adubyos (1452 MA 106). Vejamos os dados recolhidos na Tabela 9.
Da análise da tabela 9, pode depreender-se que não existe, durante o período cronológico em apreço, uma fronteira cronológica entre ambas as variantes de modo a que seja possível assinalar uma verdadeira mudança. Esta evidência ajuda a explicar a variação ainda existente bem como os diferentes matizes semânticos que se podem registar atualmente, nas línguas ibero-românicas. De facto, apesar de existir adobío na língua standard galega (‘adereço, adorno’), o Dicionario da Real Academia Galega () também apresenta adobo, com diferentes significados: 1.‘Conxunto de condimentos que se lle bota á carne ou a outros alimentos para conservalos e darlles sabor’ (com este significado, existe em variação com adubo); 2.‘Preparado que se utiliza para curtir peles’; 3. ‘Esterco ou fertilizante para a terra’ e 4. (figurado) ‘Adorno ou afeite’. Por outro lado, o Tesouro Informatizado da Lingua Galega (TILG) oferece abonações para as quatro variantes (com e sem inflexão, com e sem semivogal) em textos do século xxi: “atracado no peirao, sen pintar, coa ferruxe por adubío” (Xavier Paz, Follas de bacalhau. Vigo: Xerais, 2005); também de 2005 é a variante adobío: “O cura papará+as todas ou dará+lles destino afastado, pois o que é alí, non se ve adobío de importancia e valor coma noutros santuarios de semellante devoción” (Puentes, Aguillóns, 2005). As variantes com síncope de semivogal anterior encontram-se igualmente em textos recentes: “Non esquezan que requíren adobo, que son carnes con bravío. Eu prefiro+as guisadas com patacas brancas e pementos” (Fausto Galdo, Abecedario das mantenzas. Vigo: Xerais, 2012); na obra do mesmo autor, ocorre a variante com inflexão: “En Europa atopamos un adubo de herbas en case todas as receitas de carne ou peixe como o tomiño, o fúncho, […]” (Idem, ibidem). O item cognato adobar também existe em galego, tal como no castelhano (Llorca Freire, Ferrol, 2008): “(…) churrascos de carne de vaca, sen adobar e sen tempo de repouso para desanguentar” (), e no Dicionario da Real Academia Galega também se encontra adubar (como no português): “Adubar o peixe” ().
No português, apenas existe a variante com inflexão (adubo), que tanto pode significar ‘Ingrediente que se deita nos alimentos para os tornar mais agradáveis’ (cravo, canela, pimenta) como ‘Fertilizante químico para a terra’. Assim, a forma foi sujeita a inflexão vocálica, tendo depois desaparecido o elemento que a provocou. A variante medieval adobio permanece hoje, todavia, na forma não inflexionada adobe (com mudança de -o final para -e), eventualmente com o mesmo significado que outrora: ‘espécie de terra de que se fazem rebocos, tijolos’; ‘espécie de tijolo grande feito desse material e cozido ao sol’ ().
O Corpus del Diccionario histórico de la lengua española () apresenta 11 casos de adobio em 10 documentos cronologicamente situados entre 1275 e 1916. A última ocorrência de adobio data, precisamente, do início do século xx: “Era el adobio consiguiente de los batidos” (1916); a variante adobo, já sem semivogal, encontra-se fortemente representada entre 1140 e 1999: 816 casos em 280 documentos. No Curso de cocina profesional, 2 (de Manuel Garcés), pode ler-se: “inmersión en el adobo del pescado listo para freír” (1999-2000); também a forma adobar existe no âmbito da culinária, numa obra peruana do último ano do século xx: “porque ella decía que cortar y adobar el becerro da mucho trabajo” (La Fiesta del chivo, de Mario Vargas Llosa, 2000). De adobar contam-se 899 casos em 367 documentos cronologicamente situados entre 1140 e 2000. Uma palavra cognata é adobero, que surge em textos do Perú do século xx: “No podréis concebir un burro adobero zampándose una barrica de vino” (1908) e “El adobero, curvado sobre la planicie apisonada de la plaza, hacia su oficio con solicitud” (1941) ().
2.2.4. Exercida por grupo consonântico heterossilábico /ŋg/
Houve palavras que sofreram a ação exercida pelo grupo consonântico heterossilábico /ŋg/, tendo tido uma duplicidade de tratamento, sobretudo nas fontes galegas. Referimo-nos às formas representantes históricas de mĭnuet e mĭnua: “En todo caso, mingua (xunto a minguar e mingar, coa vogal inicial en posición átona) prevalece claramente sobre mengua (e menguar, mengar) nos textos dos séculos xiii e xiv e tamén, ainda que com menos diferenza, nos do xv” (). Diferente se apresenta a situação dos documentos centro-meridionais em análise, que mostram o timbre conservado da vogal apenas no terceiro quartel do século xiv, como se pode verificar na Tabela 10.
Em termos cronológicos, podemos concluir que o último quartel do século xiv revela-se, uma vez mais, extremamente importante para efeitos de periodização. A divergência de evolução entre o português e o galego parece, assim, ter começado a produzir-se a partir do século xiv. Como é sabido, atualmente a forma do standard galega é mingua, mas existe também mengua em algumas variedades, à semelhança, aliás, do que acontece com o castelhano normativo. Encontram-se ambas atestadas em textos do início do século xxi, de acordo com dados do TILG. Leia-se, a título de exemplo: “Un pastor de cabras, vendo que no cabo de febreiro o seu rabaño sobrevivira cáseque sen mengua ningunha, prorrompeu, con xúbito incontido, a proclamar ós catro aires a súa ledicia” (Poncelas: Contos, 2004); “a máis importante e a única que perdura na actualidade como mercado gandeiro pese a grande mingua que sufriu nas últimas décadas” (Parada, Courel: 2007) ().
O Corpus del Diccionario histórico de la lengua española () apresenta 259 casos de mingua em 60 documentos; para mengua, são 5968 ocorrências em 1586 documentos. A última ocorrência de mingua data de 1450: “por la qual señal es mostrado que la postrimera vocal mingua en la palabra” [anónimo, Las Etimologías romanceadas de San Isidoro [España] [Joaquín González Cuenca, Salamanca, Universidad de Salamanca-CSIC-Institución Fray Bernardino de Sahagún-Diputación provincial de León, 1983]. Já no século xiii, todavia, se formaram no castelhano palavras derivadas de mingua, como minguante e minguamiento: “& quando fuer stacionario. o minguante tuelle de sos annos mayores a cada dia de su estacionaridat o de su minguamiento” [1254-1260 anónimo, Judizios de las estrellas [España] [Pedro Sánchez Prieto, Alcalá de Henares, Universidad de Alcalá de Henares, 2003] ().
2.2.5. Exercida por consoante nasal homossilábica
A vogal anterior média tendeu a fechar-se quando entravada por nasal, encontrando-se, excecionalmente, grafada com ȷ́n ou ȷ̃ em documentos de princípios do século xiv, em formas como: oucíȷ́nte (< occidente) ‘ocidente’ (1304 Alc 10) e ouriȷ̃te (< oriente), ‘oriente’ (1300 Alj 8). Este fenómeno verificou-se também na região galega primitiva: “Cando a vogal /ˈɛ/ se encontraba orixinariamente entre dúas consoantes nasais homosilábicas a inflexión puído ser incluso de dous graos, como mostran os casos de aduĕnĭentĭa > auiinça (…); pertĭnĕntĭas > pertijncas (…)” ()
É igualmente um caso de inflexão vocálica exercida por nasal homossilábica que se verifica na forma mũge (< mŏnĭcu-), “chegado aos romances ibéricos a través do occitano antigo e probablemente na boca dos monxes de Cluny” (): 1289 MA 1; 1298 Alc 6; 1352 Ped 38, 2 v., embora também não tenha tido vitalidade para além do século xiv. A dupla inflexão de munge verificou-se estando a primitiva vogal tónica /ɔ/ entre duas consoantes nasais homossilábicas (). Contrastando com a precocidade da inflexão vocálica nas formas acima enunciadas, as formas tardias provencya (1505 MA 138, 2 v.), provençya (1505 MA 138, 7 v.), provẽſya (1505 MA 138) e provẽçya (1505 MA 138, 2 v.), todas registadas no mesmo documento, não dão indícios de terem cedido à influência contextual (da nasal homossilábica e/ou simultaneamente de semivogal /j/ da sílaba postónica), durante o período medieval.
Um outro fenómeno de inflexão exercida por nasal homossilábica revela igualmente o documento 1453 MA 107, onde se regista afundo (ad + fŭndu-), apesar de a variante mais comum neste corpus se apresentar com o: afondo (1315 Alj 15; 1490 MA 131) e affondo (1500 MA 136), como se pode verificar na Tabela 11.
documentos | formas | documentos | formas |
---|---|---|---|
1315 Alj 15 | afondo | ||
1453 MA 107 | afundo | ||
1490 MA 131 | afondo | ||
1500 MA 136 | affondo |
No galego medieval, documenta-se maioritariamente fondo (), que é aquela que existe atualmente nessa língua e no espanhol (fondo, n.; hondo, adj.), enquanto que as formas portuguesas são afundo (adv. ‘abaixo’, ant.) e fundo (n./adj e adv), esta última, normativa. Uma pesquisa no Corpus del Diccionario histórico de la lengua española (), leva a constatar que a inflexão também existiu nos textos castelhanos medievais: “sea condepnado en lo fundo de los infernos” (1244, Documentos mudéjares), encontrando-se abundantemente representada (com variadas aceções) em muitas obras da América latina. Numa novela chilena, por exemplo, aparece com a aceção de ‘pequena propriedade’: “Mi sueño es ser dueño de un fundo” (2003); numa obra venezuelana, como adjetivo nominalizado: “No fundo do meu raciocínio há qualquer obstáculo intrandponível” (Tópicos de retórica femenina, 1993). O mesmo acontece em palavras derivadas, como se pode ver no exemplo seguinte, onde surgem fondo, n. (forma etimológica) e pro fundo, adj. (com inflexão): “La calle era un cañon profundo y estrecho y desde su fondo profundo el vértigo tiraba de vosotros” (1951 Barea, Arturo, La forja de un rebelde [España] [Buenos Aires, Losada, 1958] Novela) ().
2.2.6. Exercida por consoante nasal heterossilábica: o caso de teſtemõio / teſtemonho > teſtemuȷ̃o / teſtemunho
Atentemos agora numa forma com o na sílaba tónica, resultante da evolução histórica de /Ō/. Iremos apresentar, a título ilustrativo, formas historicamente representantes de testĭmōnĭu. Como veremos adiante, em formas deste tipo pode ter havido dois tipos de tratamento: palatalização do grupo -nĭ-, tendo a nasal palatal [ɲ] (heterossilábica) exercido inflexão vocálica sobre a vogal da sílaba tónica, ou síncope de nasal intervocálica, deixando por vezes nasalidade na vogal precedente. Segundo , “tanto a nasal palatal como a semivogal provocaram o fechamento da vogal da sílaba tónica que passou, em muitos casos, a u”. Apresentamos na Tabela 12 as formas não inflexionadas e inflexionadas (estas, em itálico), registadas nos dois tipos, ao longo dos séculos.
Vemos, portanto, que, na amostra selecionada para corpus, a última forma a apresentar a vogal não inflexionada data de 1363, cerca de um século antes das que foram encontradas, nas mesmas circunstâncias, na coleção publicada por (teſtimoyo, 1475 L 48 e teſtemono, 1442 L 43). Por outro lado, o fechamento do timbre da vogal da sílaba tónica por influência de [j] (ou de [ɲ], se aceitarmos que o til é a abreviatura da nasal palatal) remonta, também no nosso corpus, a finais do século xiii : eſtemuȷ̃o (1291 Alc 2), teſtemũho (1291 Alc 3) e teſtemũyo (1299 Alc 7).
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1. A metafonia e a inflexão vocálica em contexto ibérico
Para além dos condicionamentos fonológicos, prosódicos e segmentais que facilitaram a articulação, na explicação da motivação das principais mudanças no vocalismo tónico de natureza assimilatória que se verificam nos documentos da zona galego-portuguesa e do Centro-litoral português, os fatores socioculturais e estilísticos, repercutidos depois na maior ou menor consciência do escriba perante a relação entre o oral e o escrito, parecem ser mais importantes do que o fator diatópico. Quando o elemento que exerce o fechamento se encontra em final de palavra, as mudanças não se repercutem de forma tão célere na língua escrita, embora seja evidente que a tendência para o menor esforço articulatório que esta harmonização revela esteve sempre presente na língua oral dos tabeliães medievais.
O que os nossos dados vêm mostrar é que as mudanças não se verificaram nos mesmos itens lexicais do espaço galego-português e muito menos ao mesmo ritmo. Assim, por exemplo, isto surge já nos textos do século xiii, mas tudo deveria ser estigmatizada na língua escrita dos tabeliães, pois só em finais do século xiv aflora, e apenas já no final (exterior) do documento. Viria a vingar na norma culta portuguesa (subsistindo em algumas variedades do asturiano), mas não no galego comum nem no castelhano, que se revelaram mais puristas. Também no subsistema pronominal (eʃto-eʃʃo-aquelo), eʃʃo (deítico anafórico geralmente ocorrendo no conector eʃʃo medes/eʃʃo meesmo) é bastante mais vulnerável à inovação do que esto, o que demonstra que o contexto discursivo, nomeadamente o de deixis discursiva (neste caso, retoma anafórica), deverá ser considerado no processo de mudança. Esta parece-nos ser uma implicação teórica importante na explicação do processo histórico da difusão de alguns casos de metafonia.
3.2. Pistas para futuras investigações
Referindo-se à metafonia na Galiza, refere que
It is lexically restricted, in the sense that only a small number of the eligible nouns and adjectives (those with final /-o/) are affected, while others (which share the same historical vowel-structure as the latter) are unaffected. There appears to be no semantic motivation for this disparity of outcomes. Nor do the words affected by metaphony in Portuguese correspond with those similarly affected in Galician.
Tendo em conta os dados relativos à análise do nosso corpus, parece pertinente recordar a conclusão de relativamente à questão da alternância vocálica como mecanismo morfofonológico motivado pela metafonia:
Se historicamente, se apreende uma mudança que incide sobre a unidade sonora, a observação da sua difusão sugere que, ao contrário do postulado pelos neogramáticos, essa transformação não afeta de modo abrupto todo o léxico onde se reúnem as condições necessárias. Pelo contrário, parece ser condicionada por características semânticas, socioculturais, pragmáticas dos itens lexicais.
Na Tabela 13 apresenta-se a cronologia das primeiras ocorrências inovadoras, com fechamento de vogal tónica motivada por metafonia e inflexão vocálica, o comportamento das mesmas formas ao longo dos séculos xiii a xvi, bem como a forma atual correspondente, nas atuais línguas ibero-românicas - o português, o galego, o asturiano e o castelhano.
A observação da evolução do comportamento da vogal tónica nos itens lexicais em apreço vem demonstrar que o português parece ter sido, neste aspeto, mais inovador do que o castelhano, mas só aparentemente o é relativamente ao galego e ao asturiano, que oferecem, em grande parte dos casos, em algumas das suas variedades diatópicas, diacrónicas e estilísticas, as mesmas soluções que vieram a integrar a norma culta portuguesa. No caso dos paradigmas dos pronomes demonstrativos, o facto de esso ter sido mais célere na evolução do que esto ter-se-á devido ao facto de naquela forma pronominal haver apenas a separar as duas vogais um fonema fricativo alveolar, ao passo que em esto, a vogal tónica é entravada por fonema fricativo, mas a vogal final pertence a uma sílaba iniciada por fonema oclusivo. Por outro lado, na tradição dos textos notariais medievais, de que o nosso corpus é apenas um exemplo, a forma esso vem, normalmente, inserida numa expressão deítica de retoma discursiva (“jsso meesmo”), o que aproxima o texto que está a ser produzido pelo eu da enunciação daquele texto que já foi dito e para cuja memória se convoca o ouvinte/leitor (jsso aponta para um referente que já estará na posse/memória de quem ouve). Por outro lado, parece haver necessidade de tornar clara, do ponto de vista comunicacional, a distinção entre uma forma já existente na língua (a forma de masculino esse) de uma outra (isso), agora promovida à existência. Essa distinção é mais nítida com alteração de timbre da vogal da sílaba tónica do que apenas pela diferente natureza da vogal final, cuja alternância entre -o e -e era frequente, ao longo da elaboração das línguas ibéricas.
A existência de um fonema oclusivo a separar a vogal que exerce a inflexão daquela que é afetada também parece ser um condicionamento importante nos fenómenos sob análise. A oclusiva bilabial sonora /b/ exerce, no entanto, maior obstáculo ao fechamento quando separa os dois elementos vocálicos palatais em palavras proparoxítonas do que em palavras em que o elemento que exerce inflexão é uma semivogal: debita e adobio, por exemplo, não apresentaram a mesma tolerância à harmonização nos diferentes espaços ibero-românicos. No português a necessidade de distinguir semanticamente adobo/-e de adubo (e de resolver, portanto, a homonímia) poderá ter sido mais um fator que condicionou o fechamento da vogal. Em outros espaços da Ibéria, a semivogal (que, em muitos casos, veio a desaparecer) revelou-se mais influente do que a vogal palatal em contexto proparoxítono. No entanto, também neste contexto, em decimo (com fonema tornado fricativo no português medieval) o português apresenta atualmente duas soluções, tendo ambas as formas (inflexionada e etimológica) sofrido um processo de conversão heterocategorial: “pagar o dízimo/ a dízima” ou “pagar a décima” (consoante as regiões), sendo que se preserva a forma etimológica como numeral ordinal. No entanto, no galego, a mesma resistência parece ter sido oferecida nas formas debida e dezimo, embora seja diferente o fonema consonântico que separa as duas vogais. Já em dŭbĭta- > dúbida, a inflexão generalizou-se nas línguas ibéricas, independentemente dos resultados. Assim, parece-nos que a natureza das vogais tónicas bem como a estrutura prosódica (dúbida / débeda / adob(í)o ~ adub(í)o) terão sido condicionamentos importantes no processo de harmonização vocálica. Provavelmente, a ditongação verificada no espanhol poderá ter sido a solução, favorecida pelo fonema fricativo (diezmo, por exemplo), eventualmente por não haver aí uma distinção entre vogais anteriores médias. Em espaço ibérico diferente do português, um contexto fónico que parece ter oferecido bastante resistência ao fechamento da vogal foi aquele em que a vogal se situa numa sílaba entravada por nasal (fondo), mas, também aqui, o fechamento da vogal em palavras derivadas (profundo) obriga a ponderar o papel da estrutura silábica neste processo.
O contexto mais propício à inflexão vocálica (excetuando na língua galega) é, eventualmente, aquele em que a vogal é influenciada pela semivogal contígua, em ditongo decrescente: oi > ui, por exemplo.
Neste artigo pretendeu-se, com atestações documentais oriundas da zona Centro-litoral portuguesa, projetar alguma luz sobre a explicação do rumo e do ritmo da mudança fónica. Alerta-se para a importância da existência de um continuum na sua difusão lexical nas línguas ibero-românicas, acentuando a importância de fatores não apenas fonológicos, segmentais e prosódicos, mas também semântico-lexicais, contextuais e discursivos, nesse processo de difusão. Mas se é certo que os fatores que levaram ao fechamento do timbre da vogal tónica (que ditariam uma evolução linguística mais ou menos natural) foram simultaneamente intra e extra-sistémicos, a verdade é que acabaram por depender da autoridade do homem sobre a elaboração dos idiomas.
Agradecimentos
Agradeço à equipa editorial de Estudos de Lingüística Galega bem como aos/às pareceristas anónimos/-as que tiveram a seu cargo a avaliação científica deste artigo, pelas pertinentes e generosas correções, sugestões e achegas que lhe fizeram. Gostaria de expressar também a minha gratidão à Senhora Professora Doutora Clarinda de Azevedo Maia, pela gentil ajuda bibliográfica recebida, fundamental para o entendimento das matérias em análise. Qualquer erro, lapso ou imprecisão que eventualmente subsistam são da minha inteira responsabilidade.
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Notas
[2] A metafonia é, portanto, um fenómeno de assimilação regressiva (a distância), total ou parcial (). Como refere , inflexão e metafonia, tendo um caráter assimilatório, andam muitas vezes associadas. Para , a metafonia é um fenómeno de harmonização exercido por vogal final, enquanto que considera metafonia o mesmo que inflexão: “al efecto (diptongación o cierre) sobre la vocal tónica de un sonido siguiente (en este caso, yod)”. Segundo , “de todas as línguas românicas o italiano, ou mais rigorosamente a região da Itália central é a menos acessível à influência metafónica”. Em contrapartida, “a língua portuguesa é das línguas românicas aquela, em que a metafonia é mais abundante, por um lado pela nitidez com que ela conserva o timbre das vogais fechadas e das vogais abertas, por outro lado, porque as outras línguas tiveram a contrariá-la o fenómeno da ditongação” (). Em português, a metafonia, para além do fechamento, também pode ter conduzido à abertura do timbre das vogais, embora seja de difícil atestação, até porque a vogal final /a/, nesta língua, nunca foi suficientemente aberta para tornar a metafonia muito produtiva. Atente-se nas definições dadas por Ariza Viguera (1989: 184): “Inflexión: Cierre de una vocal provocada por un elemento palatal o velar muy cerrado (yod o wau)”; “Metafonía: Cierre de una vocal producida por el influjo de una vocal final cerrada”.
[3] Ao longo deste artigo, apenas me centrarei nas atestações encontradas no corpus que transcrevi, uma vez que é aquele cujos documentos e critérios de transcrição conheço melhor.
[4] Ao realçar o esforço teórico de H. Lüdtke bem como a meritória recolha de materiais dialetais que realizou para o estudo deste aspeto da fonologia portuguesa, Dámaso Alonso não deixa de sublinhar a lacuna existente na teoria do jovem filólogo alemão, pelo facto de ter esquecido o galego: “Si los núcleos originarios del gallego y del castellano estaban en la época de la romanización en los mismos lugares en donde luego aparecerán en la Edad Media, se debía referir constantemente a Galicia, y claro está que para la teoría habría que haber tenido en cuenta el gallego” ().
[5] Os dados que serviram de base a este artigo encontram-se dispersos na minha tese de doutoramento (). Ao longo do artigo, a referência ao documento é feita pela mesma ordem com que aparece na referida tese bem como na edição de : data, sigla ou abreviatura do local de redação e número, dentro da coleção.
[6] De acordo com Ralph Penny, que também entende a metafonia em espaço ibérico com a formulação conceptual apresentada, trata-se da forma mais desenvolvida de harmonização vocálica, na Península Ibérica ().
[7] Nas Cantigas de Santa Maria () foram encontradas duas formas revelando metafonia (isto) e 19 formas sem fechamento de vogal tónica (esto).
[8] Este fenómeno foi já aflorado em , ao tratar da origem de -u átono final. Nessa altura, não foram contextualizadas as ocorrências nem foi feito o cômputo global das percentagens, tendo em conta toda a coleção documental.
[9] Este documento é um dos que apresenta de modo mais precoce um grande número de inovações linguísticas. Para além da forma yſto (resultante de metafonia), eſtemuȷ̃o, por exemplo, é também um item lexical onde se reflete a falta de cuidado do tabelião perante o distanciamento entre os dois códigos, oral e escrito.
[10] Excecionalmente, encontra-se na Traducción gallega de la Crónica General y de la Crónica de Castilla: en “isso que dizes” (50.18). ) refere que se documenta desde o século xiv e vai-se impondo desde o século xv: D. Pedro de Portugal, 1431: “eu non foy homen diss’isso / hu m’ as promessas faziam” 15; Orto do Esposo, jsso, 27.9; Ofícios, “e isso meesmo o assessego do coraçom”, 57.7; Imitação de Cristo, “por isso” (p. 15.38), “por ysso” (p. 31.35, etc.); Crónica de D. Pedro de Fernão Lopes: “e isso meesmo aos seus sogeitos” (p. 88.25); “e que isso meesmo fora ja a elle trautado” (p. 150.81). Vemos, portanto, que, na maioria dos exemplos, estamos perante conectores discursivos de caráter anafórico.
[11] A resistência oferecida por esta vogal à mudança deve-se, certamente, à contiguidade de duas consoantes dentais.
[14] Quanto às formas historicamente resultantes de fēcī e pŏsuī, todas as ocorrências do corpus revelam o resultado da metafonia exercida por i final, a primeira documentando-se pela primeira vez em 1300, a segunda desde 1299. Não se encontra, por isso, qualquer tipo de variação.
[15] É controversa a questão relativa à quantidade da vogal tónica, na língua latina. Sobre esse assunto, veja-se .
[16] A forma do verbo ir é única no nosso corpus. Não possuímos dados que nos permitam esclarecer a questão do supletivismo verbal.
[18] Entende-se aqui por inflexão vocálica o fechamento do timbre da vogal da sílaba tónica por influência de um som que se encontra em contiguidade com ela.
[19] Relembre-se que nos documentos publicados por Clarinda Maia ainda no século xv se registam formas como moyto e moy. No nosso corpus, algumas formas evidenciam o desenvolvimento de nasalidade sobre o ditongo, por influência da bilabial: mũytas (1440 MA 96) e mũytos (1440 MA 96 e 1443 Alf 99). Essas formas, quando apocopadas, deram origem a mujn (1437 Ped 94) e muiỹ (1490 MA 131).
[20] Uma vez que, do ponto de vista etimológico, a metafonia é definida como a “alteração duma vogal pela acção dum som, ou duma vogal, que está depois” (), este exemplo poderá ser um dos que acentua a legitimidade de distinguir metafonia de inflexão vocálica, uma vez que o fechamento do timbre da vogal tónica, apenas registado a partir de meados do século xv, se poderá ter devido ao elemento vocálico que a precede e que só a partir dessa altura se tornou fechado. Embora não se tendo implementado na norma portuguesa, ainda era possível ouvir formas deste tipo em áreas da zona Centro do país, em pleno século xx (nomeadamente aquelas em que é comum o fenómeno inverso, ou seja, a troca da nasal [ẽ] por [ã], como no distrito de Aveiro).
[21] No entanto, a vogal tónica da forma entre (< ĭnter) foi substituída, durante todo o período abrangido pelo nosso estudo, e eventualmente por dissimilação, por antre, contando-se 54 ocorrências ao longo do corpus. Em nenhum dos casos, estas alterações foram aceites pela norma culta do Português.
[23] No asturiano medieval (séc. xiii) a forma inflexionada já se encontra documentada. refere dolda (SP a. 1266) e dulda (SP a. 1293). O Corpus del Diccionario histórico de la lengua española apresenta, no entanto, a oscilação douda ~ dúvida no início do século xvii (1606-1611 MÉNDEZ NIETO, Juan, Discursos medicinales [España] [Gregorio del Ser Quijano/Luis E. Rodríguez San-Pedro, Salamanca, Universidad de Salamanca, 1989] — “Ora el quer fazer douda a Vuesa Merced e não ahy dúvida nyso” ( s. u. dúvida).
[24] Do mesmo modo, a presença do grupo consonântico /ŋk/ exerceu fechamento sobre a vogal tónica /ˈe/ (< Ĭ), na forma historicamente resultante de propĭnquu: p[ro]uĩcos, 1306 Cós 12, l. 12, embora esta forma não tenha tido evolução na língua portuguesa.
[26] Não se incluem as formas que resultaram do desdobramento de abreviaturas. Importa referir que o til sobre o u ou sobre o h deixa de se verificar a partir de 1408, o que leva a crer que se trata de um verdadeiro sinal de nasalidade e não de abreviatura.
[27] A forma standard é isto, ainda que esto tenha grande presença em variedades diatópicas. A propósito dos paradigmas das variantes fonéticas dos demonstrativos no galego e da sua localização geográfica, consulte-se Nos Índices do Atlas Lingüístico Galego (), surgem 6 formas associadas a esto (4 mapas) e 5 a isto (3 mapas).
[28] A forma isto, com metafonia, existe também (no paradigma isti, ista, isto) em certas variedades do asturiano, nomeadamente em Teberga ().
[29] A forma standard é iso, ainda que eso tenha grande presença em variedades diatópicas (). No Atlas Lingüístico Galego (), surgem 8 formas associadas a iso (4 mapas) e 2 formas associadas a eso (2 mapas).
[30] A forma isu, com metafonia, existe também (no paradigma isi, isa, isu) em certas variedades do asturiano, nomeadamente em Teberga ().
[34] A forma standard é moito, embora muito tenha grande presença em variedades diatópicas. A propósito da evolução do grupo latino -ŭlt (e outros), consulte-se . Veja-se a distribuição de -uit- e ‑oit- no mapa (elaborado por Zamora Vicente) reproduzido na página 49 da obra citada.
[35] Variante que caracteriza muitas zonas das Astúrias ocidentais: Somiedu, Babia e Llaciana, Palacios del Sil, Cangas del Narcea, Allanda, Valdés, Zona Navia-Eo, Mántaras, etc.
[36] Variante que se encontra em algumas localidades da zona central das Astúrias: Quirós, Teberga e Miranda.
[37] Variante que se encontra em Llena, Teberga, Pravia (zona central) e nas Astúrias Orientais (Llanes e Cabrales, por exemplo).
[38] Zona Navia-Eo; em A Estierna encontra-se a variante débuda, e deuda é referida por Junquera Huergo ().
[39] No asturiano atual existem ainda as variantes duda (Teberga) e dúa (Ayer). A variante dubia é referida por Apolinar de Rato y Hevia e por Constantino Cabal, e dúbida é também mencionada por Apolinar de Rato y Hevia, de acordo com .
[40] Em virtude das mudanças económico-sociais e culturais, refletidas nas relações de poder no mundo rural, está a cair em desuso o pagamento deste tributo ou imposto (‘décima parte de um rendimento’; ‘contribuição que a Igreja Católica exigia aos fiéis, e que consistia na décima parte dos frutos que colhia’; ‘antigo imposto de pescado cobrado pela Guarda Fiscal’), pelo que desaparecem também com elas as formas décima e dízimo,-a, permanecendo na língua standard apenas a forma décimo,-a, como numeral ordinal.
[42] Ver o que se disse no parágrafo 2.2.3, na sequência da Tabela 9, a propósito desta forma em português.
[43] Ver o que se disse no parágrafo 2.2.3., na sequência da Tabela 9, a propósito desta forma em galego.
[44] Também existem as variantes adobar e dobar, no asturiano. O leque de significados é mais amplo do que em castelhano, galego e português (para além dos habituais, significa igualmente: ‘condimentar’,‘arreglar los caminos’, ‘adornar lo que se dice’, ‘hacer la pelota’, ‘adular’, ‘reparar las redes’, etc.).
[48] Veja-se o que se disse no parágrafo 2.2.3, na sequência da Tabela 9, a propósito desta forma, no castelhano.
[49] A forma standard é mingua, mas existe mengua em diferentes variedades.Veja-se o que se disse no parágrafo 2.2.4, na sequência da Tabela 10, a propósito destas variantes no galego.
[50] De acordo com , é possível encontrar a variante mingua em Junquera Huergo e Apolinar de Rato y Hevia. García Arias refere, na sua Gramática Histórica, a variação menguar – minguar, a propósito da evolução de mĭnuāre, com reforço consonântico de velar ().
[51] Veja-se o que se disse no parágrafo 2.2.4, na sequência da Tabela 10, a propósito desta forma, no castelhano.
[52] O substantivo fondo também conhece a variante fundo, em Ayer. Por outro lado, a existência de frases feitas com a variante fundo atesta a existência de inflexão vocálica em épocas pretéritas do asturiano: “platu fundu” ‘prato sopeiro’; “Estar fundu” ‘ter muito apetite’.
[53] Veja-se o que se disse no parágrafo 2.2.5, na sequência da Tabela 11.
[54] A inflexão exercida por nasal palatal também se verificou no asturiano medieval: testemunno e testemunna, no século xiii ().
[55] É possivelmente a mesma necessidade de resolver casos de homonímia que explica a existência de fundo nos textos da América latina, em espanhol.
[56] A este propósito, é interessante mencionar que as formas moito e fun parecem ser específicas da língua galega, aquela refletindo eventualmente um estado de ancestralidade não partilhada com as demais línguas ibéricas analisadas, esta última apresentando um resultado com uma configuração inovadora única nas línguas da Península.