A introdução crescente das tecnologias digitais na economia criou novas oportunidades para os empreendedores e organizações (). O contexto do mundo digital, caracterizado por dispositivos tecnológicos (e.g., computação móvel) e plataformas de redes sociais (e.g., Facebook, Instagram), propiciou novas formas de desenvolvimento de modelos de negócio digitais e canais de comunicação (; ; ; ). As empresas multinacionais, mas também as empresas de pequena dimensão, passaram a desenvolver os seus negócios, ou parte destes, na Web (por exemplo, Google, Amazon, Facebook) (; ; ).
As características únicas das tecnologias digitais permitem aos empreendedores e às organizações o acesso a muitas ferramentas que podem ser usadas na inovação e criação de novos projetos (). Refira-se, a título de exemplo, a inovação aberta (open innovation) e o crowdsourcing, que facilitam o desenvolvimento de processos de co-criação e permitem incorporar o feedback dos clientes no desenvolvimento de novos produtos, serviços, websites ou aplicações (; ; ). De forma semelhante, as plataformas de crowdfunding (tais como Kickstarter, Indiegogo ou Go Fund Me) tornaram mais fácil e rápido o acesso a financiamento por parte dos empreendedores com projetos de negócio, tenham estes uma natureza social ou empresarial (). A Internet possibilitou ainda o aparecimento de novos modelos de negócio digitais (por exemplo, freemium, por subscrição, on-demand, por afiliação, drop shipping, consultoria, publicidade, blogues ou media digitais), que podem ser utilizados para a comercialização de produtos e/ou serviços. Acresce que os modelos de negócio, quer do ponto de vista das suas características como proposta de valor, continuarão a evoluir de forma significativa, mesmo após o lançamento de um produto ou serviço no mercado, em virtude de um contexto caracterizado por uma forte concorrência e rápidas mudanças tecnológicas.
O empreendedorismo digital diz respeito à prática que visa procurar novas oportunidades de negócio possibilitadas pelos novos meios de comunicação, pela internet e tecnologias digitais (). Por conseguinte, numa economia digital, os empreendedores e as organizações têm de estar cientes das oportunidades de mercado para que possam desenvolver novas ideias e modelos de negócio, bem como comunicar as suas propostas de valor a potenciais clientes e investidores ().
Esta número especial tem como objetivo contribuir para o crescente corpo de conhecimento sobre a temática da economia digital, bem como explorar a forma como os empreendedores e as organizações estão a operar num mundo cada vez mais digital. Deste modo, os artigos deste número especial apresentam os resultados de investigação obtidos em diferentes contextos.
No primeiro artigo, Silva, Moutinho e Paço analisam a relação entre empreendedorismo, políticas de intraempreendedorismo e comércio eletrónico. No artigo, os autores pretendem analisar em que medida o empreendedorismo e o intraempreendedorismo são considerados antecedentes do comércio eletrónico, bem como a relação bidirecional entre o comércio eletrónico e o empreendedorismo. O estudo incide sobre um painel de dados proveniente de duas regiões europeias, a Escandinávia (Dinamarca, Suécia, Noruega e Finlândia) e a Península Ibérica (Portugal e Espanha), entre 2012 e 2020. A relevância dos grupos estudados é reforçada pelo facto de serem culturalmente diferentes e terem perspetivas distintas quanto ao crescimento do comércio eletrónico. Os autores utilizam uma análise econométrica, baseada em modelos de erros padrão corrigidos em painel. O estudo desenvolvido pelos autores mostra uma causalidade bidirecional entre o empreendedorismo (quer do ponto de vista da criação de novas empresas como de empresas sobreviventes) e o comércio eletrónico. O estudo indica ainda que o intraempreendedorismo baseado em investigação e desenvolvimento (I&D) é um propulsor do comércio eletrónico.
O segundo artigo, de Silva, Lima e Teixeira, analisa a utilização da tecnologia aplicada às vendas pelos vendedores como fonte de informação e estímulo ao intraempreendedorismo. Os autores constatam que o uso da tecnologia na área das vendas por parte dos vendedores tem efeitos positivos no sistema de informação da empresa e, por consequência, no comportamento intraempreendedor dos vendedores (renovação estratégica e comportamento empreendedor). Os autores sugerem ainda que o sistema de informação da empresa desempenha um papel mediador entre a utilização da tecnologia de venda pelos vendedores e a renovação estratégica e comportamento empreendedor.
No terceiro artigo, com base na teoria do apoio social e nos modelos de aceitação da tecnologia, Makmor, Alam, Masukujjaman, Makhbul, Ali, and Mamun examinam os fatores que determinam a intenção de compra em websites de social commerce. Utilizando um modelo de intenção de compra, os autores analisam as respostas obtidas a partir de 392 questionários distribuídos na Malásia, utilizando um modelo de equações estruturais, através do método dos mínimos quadrados parciais. A investigação fornece novos contributos para a compreensão dos fatores capazes de influenciar a intenção de compra do consumidor, destacando o importante papel que a confiança do consumidor exerce no contexto online, bem como o apoio social (tanto na forma de apoio emocional como de apoio informacional), que estão relacionados com o modelo de aceitação da tecnologia e a intenção de compra.
O quarto artigo, desenvolvido por Bernardino, Freitas Santos e Silva, explora as ligações da rede pessoal dos empreendedores sociais e a utilização de plataformas de social media para analisar em que medida são capazes de proporcionar mais recursos à organização social. Para o efeito, é desenvolvido um modelo concetual com base na revisão da literatura. Depois disso, os autores utilizam o modelo de equações estruturais para testar as hipóteses de investigação, através de uma amostra de 313 organizações sociais portuguesas. Os autores concluem que as ligações em rede dos empreendedores sociais têm um efeito positivo no processo de aquisição de recursos, quer direto (através dos stakeholders) como indireto (através da utilização das redes sociais). O trabalho dos autores demonstra o importante papel que as redes pessoais desempenham enquanto potencial determinante da capacidade de aquisição de recursos por parte das organizações sociais portuguesas.
Por último, no quinto artigo, Katrin Kizilkan pretende alargar o conhecimento sobre o financiamento ao empreendedorismo e as plataformas digitais, em particular no âmbito do comportamento de comunicação dos empreendedores nas redes sociais. Com base na teoria da sinalização, na teoria da comunicação de Schulz von Thun e na teoria do capital social, o artigo avalia os principais fatores determinantes de sucesso no comportamento dos crowdfunders. No artigo, a autora desenvolve várias hipóteses que são testadas através de uma abordagem multivariada baseada numa regressão logística. Os dados foram recolhidos através de 169 campanhas disponíveis na maior plataforma de crowdfunding baseada em recompensas na Alemanha (Startnext). A investigação conduzida por Katrin revela quais os fatores de sucesso de uma campanha de crowdfunding na ótica do comportamento do empreendedor, bem como as principais características a que os empreendedores sociais devem estar atentos aquando da conceção de uma campanha de crowdfunding. Os resultados destacam a importância dos sinais de qualidade, como forma de redução das assimetrias de informação. O artigo apresenta recomendações práticas para os empreendedores quanto à forma de desenvolvimento de uma campanha de financiamento bem-sucedida no contexto digital, e, em particular, quanto ao uso eficaz dos meios de comunicação social no âmbito de uma campanha de crowdfunding baseado em recompensas.
Em termos gerais, cada um dos artigos deste número especial oferece novas perspetivas quanto aos desafios proporcionados pela economia digital aos empreendedorismo e organizações, incorporando, para o efeito, uma variedade de perspetivas teóricas e metodologias de investigação, evidenciando a relevância do uso de diferentes abordagens na realização da investigação no âmbito da economia digital. Com efeito, a era digital traz consigo novas oportunidades na forma como as empresas são geridas e desenvolvidas, que poderão ser exploradas quer pelos empreendedores como pelas organizações.
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