Resumen
El deber de fidelidad recíproca entre los cónyuges es uno de los deberes más importantes de un matrimonio o unión estable y ha sido disciplinado por la ley brasileña durante más de un siglo. Sin embargo, la maduración y las transformaciones sociales trajeron enormes cambios a las relaciones familiares y es relevante examinar si aún habría que imponer sanciones a quienes incumplan con este deber legal. El desarrollo teórico e investigativo impreso en la investigación se realizó a través de un método científico hipotético-deductivo, con la presentación de conceptos generales, sobre los cuales, en un segundo momento, se probaron hipótesis sobre la existencia de sanciones y sus limitaciones. La investigación tiene un carácter eminentemente teórico con el fin de contribuir al desarrollo del razonamiento jurídico-científico, habiendo sido analizadas las posiciones de reconocidos autores y las decisiones tomadas por los tribunales superiores sobre el tema con la perspectiva de presentar parámetros que orienten las reflexiones. Las hipótesis presentadas fueron confirmadas.
Palabras clave:
DEVER LEGAL DE FIDELIDADE RECÍPROCA DOS CÔNJUGES: entre os alimentos naturais e a exoneração por procedimento indigno
Renato Horta Rezende
DEVER LEGAL DE FIDELIDADE RECÍPROCA DOS CÔNJUGES: entre os alimentos naturais e a exoneração por procedimento indigno
Dereito: revista xurídica da Universidade de Santiago de Compostela, vol. 30, núm. 1, 2021
Universidade de Santiago de Compostela
DEBER LEGAL DE FIDELIDAD RECIPROCA DE LOS CÓNYUGES: entre alimentos naturales y exoneración por procedimiento indigno
LEGAL DUTY OF RECIPROCAL LOYALTY OF SPOUSES: between minimum alimony and exoneration by unworthy procedure
Renato Horta Rezende renatohorta@yahoo.com.br
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil
Copyrigth © Universidade de Santiago de Compostela
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Resumo: O dever de fidelidade recíproco entre os cônjuges constitui um dos mais relevantes deveres do casamento ou união estável sendo disciplinado pela legislação brasileira há mais de um século. Todavia, o amadurecimento e transformações sociais trouxeram enormes alterações nas relações familiares sendo relevante examinar se ainda existiriam sanções a serem impostas àquele que descumpre esse dever jurídico. O desenvolvimento teórico e investigativo impresso na pesquisa se deu por meio de método científico hipotético-dedutivo, sendo apresentados conceitos gerais, sobre os quais, em um segundo momento, foram testas hipóteses acerca da existência de sanções e suas limitações. A pesquisa possui caráter eminentemente teórico com a finalidade de contribuir para o desenvolvimento do raciocínio jurídico-científico tendo sido analisados posicionamentos de autores renomados e decisões proferidas pelos tribunais superiores sobre o tema com a perspectiva de se apresentar parâmetros a nortear reflexões. As hipóteses apresentadas foram confirmadas.
Palavras-chaves: Dever de fidelidade; sanções; procedimento indigno; alimentos naturais; Cônjuges.
Resumen: El deber de fidelidad recíproca entre los cónyuges es uno de los deberes más importantes de un matrimonio o unión estable y ha sido disciplinado por la ley brasileña durante más de un siglo. Sin embargo, la maduración y las transformaciones sociales trajeron enormes cambios a las relaciones familiares y es relevante examinar si aún habría que imponer sanciones a quienes incumplan con este deber legal. El desarrollo teórico e investigativo impreso en la investigación se realizó a través de un método científico hipotético-deductivo, con la presentación de conceptos generales, sobre los cuales, en un segundo momento, se probaron hipótesis sobre la existencia de sanciones y sus limitaciones. La investigación tiene un carácter eminentemente teórico con el fin de contribuir al desarrollo del razonamiento jurídico-científico, habiendo sido analizadas las posiciones de reconocidos autores y las decisiones tomadas por los tribunales superiores sobre el tema con la perspectiva de presentar parámetros que orienten las reflexiones. Las hipótesis presentadas fueron confirmadas.
Palabras clave: Deber de fidelidad; sanciones; procedimiento indigno; pensión alimenticia; Esposos.
Abstract: The obligation of reciprocal fidelity between spouses is one of the most relevant duties of marriage and stable union, and has been disciplined by Brazilian law for more than a century. However, the maturation and social transformations have brought enormous changes in family relationships and it is relevant to examine if there would still be sanctions to be imposed on those who fail to comply with this legal duty. The theoretical and analytical development of this research was undertaken by means of a hypothetical-deductive scientific method, with general concepts being presented, about which, in a second moment, hypotheses about the existence of sanctions and their limitations were tested. The research has an eminently theoretical character in order to contribute to the development of legal-scientific reasoning, having been analysed the positions of eminent authors and decisions made by the higher courts on the subject to encourage reflections. The hypotheses presented were confirmed.
Keywords: Duty of fidelity; sanctions; unworthy procedure; minimum alimony; Spouses.
1 Introdução
Ainda que ao longo da história do Brasil possa-se encontrar um amplo conjunto legislativo extremamente denso destinado à regulamentação do casamento capaz de variar com o tempo conforme a evolução social1 é possível afirmar que há mais de cem anos as leis brasileiras atribuem aos cônjuges o dever fidelidade recíproca, assim como também dispõem acerca das sanções a serem impostas aos infratores deste dever legal.
Mesmo diante das profundas alterações e da mencionada evolução, recentemente o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o Recurso Extraordinário nº 1.045.273 que deu origem ao tema nº 529 cuja repercussão geral foi reconhecida em que restou fixada tese, segundo a qual, o dever de fidelidade e a monogamia impede o reconhecimento de famílias simultâneas, concedendo assim ainda grande relevância jurídica ao dever de fidelidade mesmo em uniões convivências gestadas na segunda década do século XXI.
Ainda que a importância do dever jurídico à fidelidade recíproca tenha sido reforçada com a referida decisão do STF, cumpre examinar se ainda existiriam sanções a serem impostas àquele que descumpre esse dever jurídico.
Diante do problema identificado, foram investigadas duas hipóteses, a primeira que reconhece a persistência das sanções ao cônjuge infiel responsável pelo fim do casamento e a segunda de que a infidelidade não constitui procedimento indigno suficiente a impor sanção específica estabelecida no parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil.
O desenvolvimento teórico e investigativo impresso nesta pesquisa compreendem o método científico hipotético-dedutivo, partindo de concepções gerais e históricas direcionadas a alcançar objetivo geral e específico do artigo consistente em investigar as eventuais sanções impostas ao infrator do dever legal de fidelidade no casamento utilizando-se de hipóteses previamente levantadas a solucionarem o problema apresentado em consonância ou não com o posicionamento de autores familiaristas e decisões de tribunais superiores.
A pesquisa foi construída em quatro partes, na primeira seção foram apresentados o conceito jurídico e as classificações acerca da fidelidade recíproca entre cônjuges, assim como o resgate histórico comparativo das legislações que trataram do tema e as sanções à infringência ao dever legal supramencionado; posteriormente foram empenhados esforços a examinar acerca da possibilidade ou não do exame da culpa para fins de aplicação de sanções ao cônjuge considerado culpado pelo fim do casamento em virtude do descumprimento do dever legal de fidelidade; em seguida foi examinada as controversas autorias acerca da extensão e possíveis as sanções aplicadas ao cônjuge que tenha contra si reconhecida a prática de procedimento indigno; e, por derradeiro investigou-se a (im)possibilidade jurídica de aplicação da sanção ao infiel por prática de procedimento indigno considerando o texto legal, o posicionamento de especialistas e a decisão monocrática proferida no agravo em recurso especial (AREsp nº 1.269.166/SP).
Para o desenvolvimento do trabalho foi realizado amplo levantamento bibliográfico com consultas a livros, artigos científicos e decisões proferidas por tribunais superiores com a finalidade de contribuir para o desenvolvimento do raciocínio jurídico-científico sobre o tema apresentando comparações e parâmetros a nortear reflexões.
2 O dever de fidelidade e as possíveis sanções
O atual Código Civil lista em seu art. 1.5662 os deveres dos cônjuges fixando como primeiro dever a fidelidade recíproca. O arrolamento mencionado já estava presente, de forma inovadora no Brasil no Código anterior de 1916, quando em seu art. 231 dispunha acerca dos deveres dos cônjuges sendo o primeiro o dever de fidelidade recíproca.
O dever jurídico de fidelidade recíproca é também dever de caráter social, estrutural e moral3, o primeiro em virtude da determinação legal expressa, ainda que sua transgressão, por si só, não admita punição civil nem penal, o segundo relaciona-se com a monogâmica exigida socialmente pelo casamento, o terceiro por cotejar a garantia da proteção à estruturação familiar e a prole e, ainda, o quarto em virtude da lealdade às promessas que precedem o próprio enlace matrimonial.
A infringência ao dever de fidelidade, portanto a infidelidade é concebida tanto em caráter físico, caracterizada pela ocorrência de relações sexuais com terceiro(s), também denominado adultério, como em seu caráter moral, quando ausente a conjunção carnal, mas presente o relacionamento extraconjugal com terceiro(s)4.
A primeira modalidade de infidelidade, adulterina, foi considerada por muito tempo como mais grave que a segunda modalidade, estando prevista como fato suficiente a justificar o fim da sociedade conjugal desde o 1890, quando da edição do Decreto nº 181, de 24 de janeiro, em que o art. 82, §1º arrolava, em numerus clausus, os fatos que poderiam justificar o “divórcio”, vindo inclusive o Código Penal de 1940 tipificar a conduta como crime em seu art. 240, descriminalização que somente ocorreu com a publicação da Lei nº 11.106, de 28 de março de 2005.
A fidelidade como dever jurídico é fortemente combatida por alguns autores5 por condenarem a incisiva intromissão estatal nos relacionamentos sentimentais dos cidadãos impondo concepções conservadoras e modelares à pluralidade familiar a que o art. 226 da Constituição da República de 1988 consagrou, enquanto que para outros estudiosos6 o dever recíproco de fidelidade seria um corolário da formação monogâmica na qual assenta-se o casamento, sendo assim indissociável, além de que haveria grande repugnância social à pluralidade de relações não havendo que se falar em amadurecimento social neste caso.
Em 21 de dezembro de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou o Recurso Extraordinário nº 1.045.273 que deu origem ao tema nº 529 cuja repercussão geral foi reconhecida, sendo fixada a tese segundo a qual:
A preexistência de casamento ou de união estável de um dos conviventes, ressalvada a exceção do artigo 1723, § 1º, do Código Civil, impede o reconhecimento de novo vínculo referente ao mesmo período, inclusive para fins previdenciários, em virtude da consagração do dever de fidelidade e da monogamia pelo ordenamento jurídico-constitucional brasileiro7.
O verbete acima colacionado reforça o dever de fidelidade inerente ao casamento, independentemente da acertada crítica apresentada por parte dos autores familiaristas acerca da exacerbada e profunda intromissão do Estado nas relações familiares, fazendo com que a obrigação recíproca de fidelidade permaneça vigorosa no Direito brasileiro8.
Ainda que as condutas fixadas nos incisos do art. 1.566 do Código Civil, dentre as quais a fidelidade recíproca, constituam deveres jurídicos, a infração a qualquer delas, não impõe necessariamente ao infrator sanção direta, sendo indispensável para tanto a comprovação da impossibilidade da comunhão de vida (art. 1.573 do CC) e a comprovação do grave ato imputado, bem como o dano causado (art. 186 do CC) ou ainda a culpa pelo fim do casamento (art. 1.578 e art. 1.704, parágrafo único ambos do CC).
O art. 1.573 do Código Civil apresenta em seus seis incisos exemplos de motivos reconhecidos legalmente como suficientes a impossibilitar a comunhão de vidas, sendo o primeiro deles o adultério, explicitando em seu parágrafo único que poderá o juiz ater-se a “outros fatos que tornem evidente a impossibilidade da vida em comum”9 este último em reconhecimento à supremacia do princípio da ruptura objetiva do casamento sobre o princípio da culpa10.
CARVALHO11 adverte que, independentemente da ausência de avaliação da culpa na dissolução do casamento, é viável o exame na apuração de ilícitos civis inclusive por infringência aos deveres dos cônjuges, como vg, a fidelidade recíproca, sob pena de torná-los meras faculdades, desobrigatórias ou irrelevantes, algo contrário a lógica jurídica e a recente decisão proferida pelo STF em sede de repercussão geral conforme colacionado acima, sendo indispensáveis para configuração do dever de indenizar também a comprovação do nexo e dano, nos termos do que dispõe os art. 186 e art. 927 ambos do Código Civil, assim como a súmula nº 38712 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tornando-se possível a fixação de indenizações por danos morais, materiais e/ou estéticos.
Com a edição da Lei nº 6.515, de 26 de dezembro de 1977, o cônjuge considerado culpado pelo fim do casamento, diante da infringência aos seus deveres, dentre os quais a fidelidade recíproca, se mulher, perderia o direito de usar o patronímico do marido (nome de casada). A culpa pelo fim do casamento também importava, em regra, ao cônjuge infrator a perda da guarda dos filhos, como lógica decorrente de uma infração grave, bem como o dever de prestar alimentos ao cônjuge inocente caso este necessitasse, atribuindo-se aos alimentos entre cônjuges o caráter não apenas existencial, mas também indenizatório-punitivo.
O Código Civil de 2002, alinhado ao direito fundamental à personalidade reconhecido em seu art. 16 dentre outros, relativizou a sanção até então imposta exclusivamente à mulher com a perda do patronímico do ex-marido, estabelecendo em seu art. 1.578 acerca da possibilidade de conservação do sobrenome de casado a qualquer dos cônjuges que o tiver acrescido ao seu, independentemente da culpa, quando isso importar, de forma geral, em grave ameaça ao direito da personalidade.
Ademais, cumpre observar que a eventual supressão ao direito de uso do nome de casado é resultado do exame da culpa em ação judicial de separação jurídica estando esta sanção localizada no caput do art. 1.57813, do capítulo X, “Da dissolução da sociedade e do vínculo conjugal”, subtítulo I, “Do casamento”, do título I, “Do direito pessoal, do Livro IV, “Do Direito de família”. Contudo o exame acerca da culpa para fins exclusivos de dissolução do casamento, após a Emenda Constitucional nº 66, de 13 de julho de 2010, parecer ter sido suplantada, pois, ainda que distribuída ação de separação, sendo requerido o divórcio pela parte contrária, este deverá ser decretado pelo magistrado sem o exame da culpa14 o que torna a separação jurídica litigiosa inócua.
A atual legislação material afastou a conexão estabelecida pela Lei de divórcio, separando de um lado a relação entre os cônjuges e, de outro, a relação destes com seus filhos de tal sorte que a culpa pelo fim do casamento não repercuta na guarda, devendo ser observada exclusivamente “as condições fáticas e os interesses dos filhos”15 para a definição de guarda, convívio e referência domiciliar dos menores.
Ainda sobre a culpa e a sanção imposta, o Código Civil, em seu art. 1.704, parágrafo único16, localizado em subtítulo que trata especificamente “Dos alimentos”, alterou parcialmente a natureza indenizatória-punitiva destes a serem pagos pelo cônjuge considerado culpado pelo fim do sonho conjugal eterno, vindo a estabelecer como sanção ao considerado culpado a inversão da ordem dos obrigados ao pagamento de alimentos e a quantificação destes a ser paga pelo cônjuge inocente, restando limitada apenas aos alimentos naturais17,18.
A localização do artigo em que a sanção está disposta induz à conclusão de que a investigação acerca da culpa pelo fim do casamento se relacionada exclusivamente para apuração de alimentos naturais seria viável, ainda que não constitua, como afirmado acima, requisito para a decretação do divórcio, como melhor será examinado na seção seguinte.
A alteração promovida pelo atual Código Civil quanto aos alimentos devidos entre cônjuges estampou o caráter assistencial e solidarista da verba alimentar devida, mitigando o caráter indenizatório-punitivo disciplinado pela lei do Divórcio, pois, mesmo o cônjuge considerado culpado pela dissolução do casamento terá este direito a receber alimentos do cônjuge inocente caso necessite, ainda que condicionados e restritos19.
Portanto, é forço concluir que a mitigação dos alimentos, ou, o deferimento de alimentos naturais ao cônjuge considerado culpado por descumprimento de seu dever legal dentre os quais, o dever de fidelidade recíproca, quando obrigado o cônjuge inocente, poderia ser atualmente a única sanção a ser imposta ao infrator, o que inexoravelmente exigiria a apuração da culpa como condição à imposição de reprimenda.
3 O exame de culpa nas relações familiaristas
Ainda que as condutas fixadas nos incisos do art. 1.566 do Código Civil, dentre as quais a fidelidade recíproca, constituam deveres jurídicos, a infração a qualquer delas exige o exame da culpa. Todavia, há uma espinhosa controversa quando se trata do tema culpa nas relações conjugais sendo possível fixar dois vieses distintos, um de ordem prática e conjuntural e outro de ordem jurídica.
A persecução do culpado pelo fim do casamento é por demais complexa, razão pela qual a jurisprudência, acolhendo as críticas dos autores familiaristas, passou a decretar a separação judicial quando comprovada a quebra da plena comunhão de vidas, mútua assistência, afeto, ou o desamor sem a necessidade de apuração do elemento subjetivo e sua imputação a qualquer dos cônjuges ou mesmo imputando culpa a ambos, neste último caso quando não comprovado que só um deles foi o responsável pelo fracasso da união20.
Somada a dificuldade da apuração acima apontada tem-se também a devastadora consequência da investigação processual que poderia levantar questões doloridas que versam sobre a intimidade das pessoas e que, inevitavelmente, repercutiria no relacionamento pós-conjugal capaz de manter ou mesmo reanimar os acirrados ânimos entre os futuros ex-cônjuges, prejudicando frontalmente a formação da eventual prole comum que assistirá e sofrerá com o resultado alcançado, seja ele qual for21.
Quanto às dificuldades e às consequências prejudiciais a que a apuração da culpa pelo fim do casamento pode causar, tanto os autores como a jurisprudência parecem convergir, contudo, ao se examinar a sua constitucionalidade, legalidade, necessidade e consequências jurídicas há um enorme mosaico de posicionamentos divergentes.
DIAS22 e MADALENO23, por exemplo, defendem que a Emenda Constitucional nº 66/2010, teria afastado a possibilidade de discussão acerca da culpa não só nas ações que versem sobre o divórcio, mas também sobre alimentos, bem como também teria banido a separação jurídica do sistema brasileiro por arrastamento.
A radical posição esposada parece trazer maior amplitude que aquela realmente proporcionada pela mencionada Emenda Constitucional, isto porque, a toda evidência, nenhuma interpretação a partir da Constituição pode levar à conclusão que a culpa foi generalizadamente afastada das relações familiares, sendo oportuno reconhecer tão somente que a alteração apenas retirou do texto constitucional prazos e condições para o divórcio inexistindo inclusive impedimentos para que a norma ordinária assim o faça, desde que não afaste a possibilidade do divórcio dissolver o casamento civil, podendo inclusive reconhecer outras possibilidades de dissolução do casamento como se verificada no §1º do art. 1.571 do Código Civil24.
Vale ressaltar que, antes mesmo da dissolução da sociedade conjugal ser elevada à matéria de interesse constitucional com a promulgação da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934, a matéria já era regulada por norma infraconstitucional, primeiramente pelo Decreto nº 181/1890 e a posteriori pelo Código Civil de 1916, e mesmo depois da Constituição da República de 1934, a questão sempre foi regulado por norma infraconstitucional, Código de Processo Civil de 1973, Lei do Divórcio, Código Civil de 2002 e Código de Processo Civil de 2015, até mesmo porque, a regulamentação do divórcio não é questão materialmente constitucional25, cabendo ao legislador ordinário a sua regulamentação.
Por sua vez, FARIAS e ROSENVALD26, assim como CARVALHO27 e RIZZARDO28, ainda que partam da mesma compreensão acerca da EC nº 66/2010 quanto a inviabilidade de apuração de culpa para decretação do divórcio, divergem dos autores anteriores quanto ao afastamento generalizado da apuração de culpa em qualquer tema familiarista. Para os autores mencionados há pouco, seria possível a apuração da culpa para o exame do quantum devido em razão dos alimentos, bem como indenizações por ilícitos civis amplos, porém, em ambos os casos, a apuração da culpa, deveria se dar por meio de ações judiciais autônomas, não se admitindo a discussão quando cumulados tais requerimentos com o divórcio.
O posicionamento inicialmente temperado impõe restrição que pode inviabilizar a efetiva discussão acerca da culpa para a apuração desejada, ainda que afastado seu exame para fins de divórcio, isto porque, distribuída a ação de divórcio cumulado com requerimento de alimentos pelo cônjuge infrator de dever legal estabelecido no art. 1.566 do CC, estaria o cônjuge interessado na apuração da culpa impossibilitado de discuti-la nos mesmos autos, assim como em ação autônoma diante da litispendência.
Também entendendo não ser mais viável a discussão acerca da culpa após a edição da referida Emenda Constitucional para a decretação do divórcio, TARTUCE29 compreende que, excepcionalmente, pode ser discutida a culpa em sede de ação de divórcio quando cumulada com requerimentos diversos, mantendo-se um sistema dualista com ou sem culpa, sendo possível assim a distribuição de apenas uma ação judicial com pedidos cumulativos em que não se examinará a culpa para decretação do divórcio, mas será realizada análise do elemento subjetivo que conduziu ao fim do casamento em outros requerimentos dentro do mesmo processo.
Parece que o posicionamento de TARTUCE acerca da possibilidade de exame da culpa encontra amparo tanto no princípio da economia processual como dentro da sistemática do atual Código de Processo Civil que afastou terminantemente o princípio da unicidade do julgamento, por meio da viabilidade de proferimento de decisões parciais e sucessivas conforme o interesse das partes e a definição de prioridades, mantendo ainda convergência com o texto constitucional e com a norma infraconstitucional.
4 Delimitações do procedimento indigno
O Código Civil de 2002 inovou ao trazer a sanção por ato indigno sem, contudo, conceituar o que seria este, tornando-se assim um campo fértil para autores familiaristas debatem e fixarem convicções.
Buscando um conceito amplo, CARVALHO30 relaciona a indignidade com a imoralidade enquanto HIRONAKA31 relaciona o procedimento indigno a uma prática específica e violenta de cunho físico e/ou moral voltada para a destruição do outro, ao seu enfraquecimento, ou à inviabilidade de sua felicidade, estando assim eivada de má-fé.
A conceituação ampla parece suficiente a delimitar satisfatoriamente qual o bem jurídico a ser protegido, a dignidade, porém, não o bastante para delinear objetivamente qual seria a ação positiva a proporcionar a imposição de reprimenda ou, seja, o procedimento indigno a que alude o parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil, abrindo assim espaço para dois caminhos antagônicos trilhados pelos autores familiaristas, o primeiro mais abrangente, aduzindo se tratar de cláusula geral a ser completada pelo intérprete conforme a casuística, possuindo como parâmetro a boa-fé objetiva e a tese dos deveres anexos32, e o segundo caminho direcionado à interpretação analógica restritiva que considera as disposições legais semelhantes e suas limitações possíveis frente a sistemática jurídica33.
O estudo acerca da fenda aberta no parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil é importante diante da dinâmica e das inúmeras ocorrências que envolvem as relações pós-ruptura do casamento, advertindo PEREIRA34 que o conceito aberto direcionado à preservação de práticas éticas justificaria, por exemplo, a exoneração do encargo alimentar quando comprovada a prática de atos antiéticos como a alienação parental.
CARDOSO35 assevera que apesar da amplitude extraída do dispositivo deve ser observada a profunda gravidade do procedimento para ser adjetivado como indigno, afastando-se meros desagrados, discordâncias, divergências de opiniões ou ausência de afeto.
Certamente a dificuldade enfrentada pelo posicionamento mais abrangente relaciona-se à possibilidade de reconhecimento de infinitas hipóteses de atos e atitudes que poderiam configurar a indignidade do credor de alimentos, até mesmo porque, as relações familiares são marcas por confrontos e, por vezes, a disputa ultrapassa os limites da civilidade e respeito inexistindo um padrão ou um modelo ideal de família e relações familiares a serem especialmente tutelados36.
Ademais, a abertura demasiadamente grande poderia tornar as relações familiares e suas consequências instáveis, além de proclamar um tratamento diferenciado de todo aquele disciplinado pelo Código Civil rompendo assim o arcabouço lógico-sistêmico estabelecido pela legislação para casos análogos para os quais são previstos relação taxativa37 de procedimentos tidos como indignos.
De forma mais restrita, DIAS38 adverte que diante da ausência de um rol destinado a elencar os procedimentos indignos deve-se observar os procedimentos indignos legalmente reconhecidos pelo Código Civil, sendo estes aqueles destinados à sanção por ingratidão do donatário e à indignidade do herdeiro, não podendo ser empregada interpretação que transborde os casos análogos previstos em lei, preservando-se, portanto, a lógica sistêmica e a preservação de direitos relacionados à solidariedade.
Em sentido próximo foi editado o enunciado nº 264 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, cujo verbete colaciona-se: “Art. 1.708: Na interpretação do que seja procedimento indigno do credor, apto a fazer cessar o direito a alimentos, aplicam-se, por analogia, as hipóteses dos incs. I e II do art. 1.814 do Código Civil”39.
O posicionamento restrito apesar de sanar a dificuldade da posição extensionista estabelecendo critérios palpáveis e seguros, pode deixar escapar atos graves que potencialmente surjam no interior das relações conjugais ou pós-conjugais não previstas em outros institutos em virtude da especialidade, não podendo ainda olvidar que o próprio legislador aderiu à escolha de não propor parâmetros demasiadamente rígidos.
Atentos a isto, FARIAS e ROSENVALD40 compreendem que o conceito aberto previsto no dispositivo sob exame possuiria limites referendados pela tipicidade finalística que limitaria a subjetividade do julgador às regras estabelecidas pelo Código Civil, não de forma estanque em um rol taxativo, mas à ratio essendi de casos análogos aos previstos legalmente.
O posicionamento intermediário proposto parece atender à dupla dificuldade da interpretação ampla e restrita, ampliando as possibilidades de reconhecimento da prática de procedimento indigno e, ao mesmo tempo, a restringindo, todavia, à finalidade esculpida no rol previsto nos art. 55741 e art. 1.81442, ambos do Código Civil, como bem exemplifica os autores acima citados:
Exemplificando, apesar de os arts. 557 e 1.814 do Estatuto Substantivo somente fazerem alusão ao homicídio doloso, tentado ou consumado, como hipótese de comportamento indigno, é possível ao juiz reconhecer o auxílio, induzimento ou instigação ao suicídio, casuisticamente, como causa de indignidade, por revelar a mesma finalidade da norma legal. A outro giro, no entanto, não seria possível ao magistrado reconhecer um homicídio meramente culposo por se afastar da finalidade normativa43.
A mesma divergência acerca da definição e extensão daquilo que poderia ser considerado procedimento indigno também se verifica quanto à definição das consequências, ainda que o parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil preveja expressamente a exoneração como sanção a ser aplicada àquele que executar procedimento indigno contra o prestador de alimentos.
Alguns autores familiaristas44 compreende que comprovada a conduta indigna do Alimentado frente ao Alimentante caberia tanto a extinção parcial como a extinção total do dever alimentar, argumentando que o princípio da solidariedade conjugado com o disposto no §2º do art. 1.69445 do Código Civil afastaria a possibilidade de exoneração automática se presente a necessidade do Alimentado mesmo que comprovado o procedimento indigno, fundado na máxima jurídica segundo a qual quem pode mais, também pode menos, ou seja, se é possível a exoneração (maior sanção) também é possível o deferimento de alimentos naturais (menor sanção).
O posicionamento acima reflete o disposto no enunciado nº 345 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal, ao dispor que “o ‘procedimento indigno’ do credor em relação ao devedor, previsto no parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil, pode ensejar a exoneração ou apenas a redução do valor da pensão alimentícia para quantia indispensável à sobrevivência do credor”46.
No sentido exclusivamente exoneratório, outros autores familiaristas47 observam a literalidade do disposto no parágrafo único do art. 1.70848 do Código Civil, quando este fixa a cessação do dever de alimentar como sanção à prática antiética.
Cabe observar que tanto o parágrafo único do art. 1.708, quanto o §2º do art. 1.694 ambos do Código Civil estão inseridos no mesmo subtítulo III “dos alimentos” devendo a interpretação entre os dispositivos se dar de forma sistemática e harmônica com a finalidade de conceder sentido a ambos sem eliminá-los, sob pena de causar insegurança jurídica e romper a sistemática codificada.
A cogitação acerca da possibilidade da aplicação de duas regras diferentes, inclusive em dispositivos diversos, ao mesmo fato parece indubitavelmente inviáveis e injustificável juridicamente não havendo espaço para tamanha abertura sem que isto conduzisse a inevitável insegurança jurídica em virtude do desprezo da norma.
Apesar da respeitada controversa existente, compreende-se que os temas disciplinados pelos dispositivos supracitados são independentes e, estabelecer a relativação do parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil, poderia de fato sepultar a sua completa incidência promovendo por meio da interpretação orientada pelo enunciado nº 345 do CJF a sua revogação tácita contrária ao que dispõe o Decreto-Lei nº 4.657, de 4 de setembro de 1942.
Ademais a pretensão de aplicação da mitigação dos alimentos previstas no §2º do art. 1.694, exclusivamente ao parágrafo único do art. 1.708 e não ao seu caput traria instabilidade à sistemática codificada, pois a inaplicabilidade da cláusula reducionista ao caput do art. 1.708 do Código Civil parece óbvia, diante da existência de nova relação familiar49 o que, por arrastamento, deve se aplicar à possibilidade mais específica editada no parágrafo único, ou seja, a sanção possível a ser aplicada àquele que tiver procedimento indigno é também exclusivamente a exoneração do dever alimentar.
O procedimento indigno diante de sua gravidade, violência e má-fé suficiente a atentar contra a dignidade justifica tanto a restrição às possibilidades de aplicação como a gravosa sanção exoneratória a ser imposta.
5 O descumprimento do dever conjugal de fidelidade e o procedimento indigno
Em 18 de dezembro de 2018, a ministra Maria Isabel Gallotti, relatora no Agravo em Recurso Especial nº 1.269.166/SP, proferiu decisão monocrática negando o prosseguimento do recurso em conformidade com a súmula nº 750 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), justificando ainda que o dissídio jurisprudencial não teria sido comprovado diante da ausência de exame analítico entre os paradigmas apontados.
O referido recurso aviado pretendia destrancar o Recurso Especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que reconheceu como procedimento indigno a infidelidade virtual praticada pelo cônjuge virago durante o casamento capaz de causar ofensa à honra subjetiva do cônjuge varão, conforme ementário:
INDIGNIDADE. CÔNJUGE. INFIDELIDADE VIRTUAL. COMPROVAÇÃO. CESSAÇÃO DA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
Litispendência. Pressuposto processual negativo. Correlação com ação de separação judicial. Impossibilidade. Ausência de identidade entre os elementos identificadores da ação. Efeitos diversos. Extinção afastada. Julgamento do mérito, nos termos do art. 515, § 3°, do CPC.
Indignidade. Cônjuge. Reconhecimento. Infidelidade virtual comprovada nos autos. A ré manteve relacionamento afetivo com outro homem durante o casamento. Troca de mensagens eletrônicas de cunho amoroso e sentimental. Caracterização de infidelidade, ainda que virtual. Ofensa à dignidade do autor.
A infidelidade ofende a dignidade do outro cônjuge porquanto o comportamento do infiel provoca a ruptura do elo firmado entre o casal ao tempo do início do compromisso, rompendo o vínculo de confiança e de segurança estabelecido pela relação afetiva. A infidelidade ofende diretamente a honra subjetiva do cônjuge e as consequências se perpetuam no tempo, porquanto os sentimentos negativos que povoam a mente do inocente não desaparecem com o término da relação conjugal. Tampouco se pode olvidar que a infidelidade conjugal causa ofensa à honra objetiva do inocente, que passa a ter sua vida social marcada pela mácula que lhe foi imposta pelo outro consorte. Mesmo que não se entenda que houve infidelidade, a grave conduta indevida da ré em relação ao seu cônjuge demonstrou inequívoca ofensa aos deveres do casamento e à indignidade marital do autor. Indignidade reconhecida. Cessação da obrigação alimentar declarada. Procedência do pedido. Recurso provido51.
A toda evidência observa-se que o STJ não reconheceu que suposta infidelidade, primeiro dever conjugal capitulado no art. 1.566 do Código Civil, corresponderia a procedimento indigno52, primeiramente por se tratar de decisão monocrática não proferida por qualquer turma que compõe a segunda seção especializada53, e, em segundo lugar, por não ter havido nenhum exame sobre as razões recursais, em virtude da aplicação da súmula nº 7 do STJ.
Por sua vez, o TJSP apresentando interpretação extensiva quanto ao procedimento que poderia ser reconhecido como indigno e, específico quanto a sanção a ser imposta, exoneração do dever alimentar, reconheceu que a infringência ao dever recíproco de fidelidade dos cônjuges constitui procedimento indigno suficiente a fazer cessar o dever alimentar entre cônjuges.
Mesmo não tendo a pretensão de julgar acertos ou erros judiciários na aplicação da norma ao caso concreto, cumpre destacar, a luz da compreensão esposada por CARDOSO que é de extrema importância examinar o tempo em que o procedimento indigno foi praticado para que então se possa aplicar a regra prevista no parágrafo único do art. 1.704 do Código Civil ou aquela contida no parágrafo único do art. 1.708 do mesmo caderno legal, ou seja, culpa pelo fim do casamento ou comportamento indigno.
A importância aflorada se deve às consequências gravosas advindas de cada disposição que se mostram independentes, isso porque, enquanto a culpa atribuída ao alimentado pelo fim do casamento constitui fator redutor da pensão alimentícia, alimentos naturais54, o procedimento indigno repercutiria na cessação do dever alimentar, exoneração55.
TARTUCE aduz que, procedimentos indignos podem ocorrer tanto durante o casamento como após a sua dissolução, conduto somente àqueles praticados depois do fim do casamento poderiam ensejar a cessação do dever ou obrigação alimentar, tratando-se, pois, de “espécie de responsabilidade pós-negocial casamentária ou convivencial ou pós-contratual”56.
Em sentido próximo, e de forma muito didática, CARDOSO57 leciona que somente atos praticados após à fixação do dever alimentar e ainda presentes quando do pleito exoneratório poderiam ser sancionados na forma estabelecida pelo parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil, conduzindo assim à exoneração do dever ou obrigação alimentar, enquanto atos, ainda que também indignos praticados durante o casamento ou união estável quando decisivos para o fim do casamento ou união estável estariam sujeitos a inversão da ordem dos obrigados e redução dos alimentos ao indispensável à sobrevivência do cônjuge declarado culpado pelo fim do casamento, quando prestados pelo cônjuge inocente ao culpado.
Aplicado ao parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil interpretação gramatical, CARDOSOS58 ainda adverte que a redação do mencionado dispositivo quando utiliza os termos “credor” e “devedor” já indica existir o dever de pensionamento definitivo, enquanto no parágrafo único do art. 1.704 também do Código Civil utiliza-se o termo “cônjuge” indicando que a análise sobre os fatos e circunstância compreendem o tempo em que os envolvidos estavam imersos na conjugalidade.
Utilizando também de raciocínio lógico não seria razoável admitir a existência de dois dispositivos diversos, parágrafo único do art. 1.704 e parágrafo único do art. 1.708 ambos do Código Civil a regularem as mesmas ações praticadas ao mesmo tempo, sendo imperiosa a sua distinção.
Assim, para a infringência dos deveres previstos no art. 1.566 e art. 1.573 ambos do Código Civil ao tempo do casamento ou união estável a sanção corresponderia a alteração da ordem dos obrigados a pensionar, assim como a possibilidade do infrator a receber apenas alimentos naturais quando obrigado o cônjuge inocente, enquanto o reconhecimento de procedimento indigno cometido em momento posterior ao fim do casamento caberia a cessação do dever alimentar.
Compreendendo a diversidade das sanções a serem aplicadas conforme o tempo de sua execução, é forçoso admitir que procedimentos indignos praticados durante o casamento, mesmo que responsáveis pelo fim do enlace conjugal, não poderia ser sancionado com a cessação do dever alimentar caso pendente a necessidade do cônjuge infrator, tendo em vista a previsão específica estabelecida pelo parágrafo único do art. 1.704 do Código Civil.
Ademais, o inciso I do art. 1.573 do Código Civil fixa expressamente o adultério como motivo suficiente a caracterizar a impossibilidade da comunhão de vida o que poderia ensejar a aplicação do fator redutor de alimentos e alteração da ordem obrigacional de alimentar caso a infração ao dever conjugal de fidelidade fosse determinante para o fim do casamento, nos termos do parágrafo único do art. 1.704 do mesmo caderno legal.
Desta forma, caso a infidelidade conjugal, adulterina ou não, fosse descoberta pelo cônjuge inocente somente após o deferimento de alimentos ao consorte infrator e o divórcio do casal, o fator redutor também não poderia ser aplicado e tampouco a inversão da ordem dos obrigados a pensionar, pois ainda que a infração possa ter contribuído de forma indireta para o fim do casamento, o resultado não decorreu diretamente da descoberta do descumprimento da fidelidade recíproca somente evidenciada a posteriori.
A descoberta tardia do descumprimento do dever conjugal, considerando esta somente após o fim do casamento ou união estável, também não ensejará a possibilidade de cessão do dever alimentar tendo em vista que os atos considerados indignos devem ser praticados pelo credor dos alimentos ao tempo em que se tornou efetivamente credor e não em lapso anterior quando inexistia crédito.
Vale ainda destacar, nos termos do art. 1.708 do Código Civil, que persistindo a necessidade do alimentado após o fim do matrimônio, somente novo casamento, união estável, concubinato ou procedimento indigno poderia fazer cessar o dever alimentar, de tal sorte que o simples namoro do credor de alimento não é suficiente para exonerar a obrigação alimentar, pois o exercício descompromissado da liberdade afetiva e sexual possui guarida constitucional não podendo sofrer controle ou restrição do ex-consorte, justamente porque a separação põe termo ao dever de fidelidade recíproca59.
Desta forma a definição do tempo em que o procedimento indigno praticado foi praticado, assim como o tempo em que ele foi descoberto e a sua consequência são extremamente relevantes para a aplicação da sanção legalmente prevista, ora no parágrafo único do art. 1.704, ora no parágrafo único do art. 1.708, ambos do Código Civil.
6 Conclusões
Há mais de um século a legislação brasileira fixa os deveres entre os cônjuges, dentre os quais, o dever de fidelidade recíproca, apresentando com o tempo variada gama de sanções a serem aplicadas aos infratores.
Recentemente o STF julgou o tema nº 529, cuja repercussão geral foi reconhecida, reforçando a relevância no direito brasileiro do dever de fidelidade, deixando assim claro, a toda evidência, que a sua infringência deve comportar sanções previstas ordinariamente, atualmente restrita apenas ao recebimento, no caso de necessidade, de alimento naturais do cônjuge inocente e ainda somente quando não tiver parentes em condições de prestá-los.
Para o exame das consequências do fim do casamento decorrente da infidelidade que se restringe exclusivamente aos alimentos é indispensável a avaliação da culpa estritamente para este fim, possibilidade esta não afastada pela Emenda Constitucional nº 66/2010. Apesar da divergência acadêmica, o exame da culpa para apuração dos alimentos naturais entre ex-cônjuges ou ex-companheiro não exige procedimentos diversos, sendo possível a averiguação nos mesmos autos em que se pretenda o divórcio, ainda que quanto a este último não caiba mais a discussão acerca da culpa, mas somente relativo ao primeiro.
O procedimento indigno do credor de alimentos que, nos termos do parágrafo único do art. 1.708 do Código Civil, comportaria a cessão do dever alimentar não alcançariam a infringência aos deveres do casamento, dentre os quais a fidelidade recíproca, justamente porque há previsão legal menos gravosa disciplinada no parágrafo único do art. 1.704 do Código Civil, além do que, os atos indignos a ensejar a cessão da obrigação alimentar estão reservadas ao tempo em que o crédito alimentar passa a existir, ou seja, eventualmente, após o fim do casamento ou união estável.
Desta forma, atualmente, a sanção a ser imposta àquele que descumpre o dever jurídico de fidelidade recíproca entre cônjuges se resume ao recebimento de alimentos do consorte inocente, quando necessitar, restritos ao indispensável à sua sobrevivência, após apurada a inexistência de parentes em condições de prestá-los, não sendo cabível o exame acerca do procedimento indigno frente ao descumprimento do dever recíproco de fidelidade entre cônjuges ou entre companheiros.
Referências
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Superior Tribunal de Justiça. Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça.
Supremo Tribunal Federal (STF). Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 1045273. Relator Min. Alexandre de Moraes. Julgado em 20/12/2020.
Notas
2
“Art. 1.566. São deveres de ambos os cônjuges:
I - fidelidade recíproca;
II - vida em comum, no domicílio conjugal;
III - mútua assistência;
IV - sustento, guarda e educação dos filhos;
V - respeito e consideração mútuos” (BRASIL, 2002, S/P).
4
D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 239.
5
V.g. F. ULHOA COELHO, Curso de Direito Civil: Direito de família e sucessões, Saraiva, São Paulo, 2006, p. 53-54. M. BERENICE DIAS, Manual de Direito das Famílias, 4ª edição, Revista dos Tribunais, São Paulo, 2016, p. 297. P. STOLZE GAGLIANO; R. PAMPLONA FILHO, Direito Civil: Direito de família, 9ª ed., 6º vol., Saraiva Educação, São Paulo, 2019, p. 322. P. LÔBO, Direito Civil: família, 8ª ed., 5º vol., Saraiva Educação, São Paulo, 2018, p. 99.
6
V.g. D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 240. R. MADALENO, Direito de família, 8ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2018, p. 257. C. A. DABUS MALUF; A. CALDAS DO REGO FREITAS MALUF, Curso de Direito de Família, 3ª ed., Saraiva Educação, São Paulo, 2018, p. 68. A. RIZZARDO, Direito de Família, 10ª edição, Forense, Rio de Janeiro, p. 260.
8
Esclarece-se que este autor possui posicionamento diverso da tese nº 529 editada pelo STF em sede de repercussão geral possuindo firme entendimento de que a monogamia é princípio inerente ao casamento e não há união estável diante da pluralidade de modelos familiares reconhecidos pela Constituição da República de 1988, sendo assim constitucional o arranjo familiar simultâneo não havendo, respeitado posicionamentos diversos, também qualquer afronta à norma infraconstitucional que estabelece o dever de lealdade e não fidelidade (art. 1.724 do Código Civil).
9
Lei 10.406/2002, de 10 de janeiro de 2002. Código Civil, s/p.
10
R. MADALENO, Direito de família, 8ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2018, p. 331.
11
D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 145.
12
“Súmula nº 387 - É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral” (STJ).
13
Art. 1.578. O cônjuge declarado culpado na ação de separação judicial perde o direito de usar o sobrenome do outro, desde que expressamente requerido pelo cônjuge inocente e se a alteração não acarretar:” (Código Civil).
15
Lei 10.406/2002, de 10 de janeiro. Código Civil, s/p.
16
“Art. 1.704. Se um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial.
Parágrafo único. Se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência” (Código Civil, s/p.).
18
“Alimentos naturais ou necessários - possuem alcance limitado, compreendendo estritamente o necessário para garantir a subsistência” (M. BERENICE DIAS, Alimentos: direito, ação, eficácia e execução. 3ª edição, JusPodivm, Salvador, 2020, p. 25).
21
P. LÔBO, Direito Civil: família, 8ª ed., 5º vol., Saraiva Educação, São Paulo, 2018, p. 105.
23
R. MADALENO, Direito de família, 8ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2018, p. 518; 1250.
24
“§1º O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida neste Código quanto ao ausente (Código Civil 2002, s/p).”
25
“São normas fundantes (basilares) que fazem parte do “núcleo ideológico” constitutivo do Estado e da sociedade. Sem dúvida, essas matérias com o advento do constitucionalismo (moderno) vêm sendo definidas como: Organização e estruturação do Estado e Direitos e Garantias fundamentais” (B. GONÇALVES FERNANDES, Curso de Direito Constitucional, 10ª ed., Juspodivm, Salvador, 2018, p. 38).
27
D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 430.
28
A. RIZZARDO, Direito de Família, 10ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2019, p. 47.
30
D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 862.
35
F. DOMIGUES CARDOSO, A indignidade no direito aos alimentos, IASP, São Paulo, 2018, p. 325.
37
“As hipóteses legais constituem numerus clausus, ou seja, encerram-se em tipicidade fechada, não podendo outras condutas, por mais graves que sejam, fundamentar a exclusão do herdeiro. Assim é porque em nosso direito as restrições de direito são apenas as que a lei explicita, sendo vedada a interpretação extensiva” (LÔBO, 2018a, p. 136).
41
“Art. 557. Podem ser revogadas por ingratidão as doações:
I - se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele;
II - se cometeu contra ele ofensa física;
III - se o injuriou gravemente ou o caluniou;
IV - se, podendo ministrá-los, recusou ao doador os alimentos de que este necessitava” (BRASIL, 2002, s/p).
42
“Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários:
I - que houverem sido autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II - que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III - que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade” (BRASIL, 2002, s/p).
44
Vg: D. MESSIAS DE CARVALHO, Direito das famílias, 6ª edição, Saraiva Educação, São Paulo: 2018, p. 862. M. BERENICE DIAS, Alimentos: direito, ação, eficácia e execução. 3ª edição, JusPodivm, Salvador, 2020, p. 144; e C. CHAVES DE FARIAS; N. ROSENVALD, Curso de Direito Civil: famílias, 12ª edição, JusPodivm, Salvador, 2020, p. 813.
45
“Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.
§1º Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada” (Código Civil de 2002, s/p).
§2º Os alimentos serão apenas os indispensáveis à subsistência, quando a situação de necessidade resultar de culpa de quem os pleiteia.
47
Vg: C. R. GONÇALVES, Direito Civil Brasileiro: Direito de família, 9ª ed., Saraiva, São Paulo, 2012, p. 455; C. A. DABUS MALUF; A. CALDAS DO REGO FREITAS MALUF, Curso de Direito de Família, 3ª ed., Saraiva Educação, São Paulo, 2018, p. 195-196; e R. MADALENO, Direito de família, 8ª edição, Forense, Rio de Janeiro, 2018, p. 1.299.
48
“Art. 1.708. Com o casamento, a união estável ou o concubinato do credor, cessa o dever de prestar alimentos.
Parágrafo único. Com relação ao credor cessa, também, o direito a alimentos, se tiver procedimento indigno em relação ao devedor” (Código Civil de 2002, s/p).
49
Ressalva-se que, aparentemente, com o julgamento do tema da repercussão geral nº 529 pelo STF o Direito brasileiro não reconhece como entidade familiar o concubinato a que alude o caput do art. 1.708 do Código Civil.
50
“Súmula nº 7: a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial” (BRASIL, 1990, p.2).
52
Alguns sites jurídicos apresentaram manchetes tais como: “O infiel não tem direito à pensão alimentícia, reconhece o STJ”, veiculada no jusbrasil.com.br; “Você sabia que o infiel não tem direito à pensão alimentícia? reconheceu o STJ”, veiculada no jus.com.br.
53
Superior Tribunal de Justiça. Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, p. 26.
57
F. DOMIGUES CARDOSO, A indignidade no direito aos alimentos, IASP, São Paulo, 2018, P. 418.
58
Idem, p. 418.
ISSN: 1132-9947
Vol. 30
Num. 1
Año. 2021
DEVER LEGAL DE FIDELIDADE RECÍPROCA DOS CÔNJUGES: entre os alimentos naturais e a exoneração por procedimento indigno
Renato Horta Rezende
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte,Brasil
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